Capítulo 43 – Condescendente

Capítulo 43 – Condescendente

 

Sam acordou as seis com a sirene e o barulho das portas de aço das celas se abrindo. Ainda estava com sono e cansada, com muito custo conseguiu arrancar de sua companheira a informação de que o café era servido as sete.

Após seu café silencioso e solitário, levantou e hesitou na escolha do seu destino. Resolveu ir para o pátio, para onde a maioria já tinha seguido.

Quase congelou em poucos minutos, mal pode observar aquele espaço aberto com algumas quadras esportivas e centenas de mulheres vagando lentamente de um lado para outro em grupos, a neve cobria quase todo o chão. Tremia.

Resolveu voltar para o interior, mas foi impedida por um mão que segurou seu braço.

– Olá, você é a novata, não é? Samantha? – Uma garota de cabelos castanhos e belos olhos verdes, de aproximadamente trinta anos, a indagou.

– Sou, por que? – Respondeu na defensiva.

– Eu sou a Yulia, essa é a Carmen, mas a Carmen não fala. Nós somos do comitê voluntário de boas-vindas e recepção, desculpe não ter conseguido conversar com você ontem, acho que você chegou já com as celas fechadas.

– O que vocês fazem?

– Orientamos as novatas. É tipo um serviço, sabe? Cada três dias de trabalho reduz um dia na pena, e só conta como dia de trabalho quando chega alguém, então estou feliz em ter você aqui. – Sorriu, e a Carmen silenciosa também sorriu.

Sam a analisou por alguns segundos, tinha um pé atrás com tudo e todos ali.

– Por favor, isso não é alguma peça que estão querendo me pregar, é?

– Não, nós realmente estamos aqui para dar as orientações básicas. Tome, esse é o folheto com as regras.

Sam tomou o papel em mãos, confusa.

– Podemos ter papel aqui dentro?

– Sim. – Começou a falar num tom didático. – É permitido a guarda de papel digital e papel de verdade, mas é vedada a guarda de canetas, lápis e congenerés.

– É congêneres, se fala congêneres. – Sam a corrigiu.

– Isso, isso aí também é proibido, mas não sei o que é, deve ser algum tipo de lápis.

Sam deu uma lida rápida no folheto em mãos, instruções básicas, horários, orientações comportamentais, era surreal perceber que estava agora sob um novo regime de vida, encarcerada e com regras restritivas.

– Tem alguma dúvida? – Perguntou a detenta mexendo em seus cabelos na altura dos ombros.

– Sim, quando será minha audiência preliminar?

Yulia riu.

– Não sou juíza não, Samantha, estou tão ferrada quanto você.

– Eu ainda nem sei porque estou ferrada, não sei do que me acusam.

– Ah, não se preocupe, notícias ruins vem rápido, logo marcam a audiência. Com sorte marcam também o dia do julgamento, mas demora, viu?

– Demora?

– O meu levou seis meses para acontecer.

– Meu Deus… – Sam baixou a cabeça desanimada, estava encolhida de frio.

– Quer conversar lá dentro?

– Sim, por gentileza, estou virando um picolé.

***

Por conta do feriado, Theo e Stefan tiveram dificuldade em encontrar um restaurante aberto no bairro, queriam jantar algo mais barato que a refeição do hotel. Acabaram num café duas quadras abaixo.

– Sente aqui, vou encontrar alguém para nos atender, estou apenas com o café da manhã no estômago. – Stefan reclamou e levantou da mesa após aguardar em vão alguém atendê-los.

Após um atendente sonolento anotar os pedidos, começaram as perguntas de Theo.

– Já sabe onde será a audiência?

– Lá em Krasno… Não sei falar o nome inteiro dessa cidade.

– Como vamos até lá?

– Vou alugar um carro amanhã à noite, a audiência dela está agendada para 11:15h da manhã.

– 11:15h?

– São várias audiências por período, em intervalos de 15 em 15 minutos.

– É assim tão rápido?

– O juiz chama o número do caso e os envolvidos, cita o nome do réu, chama o promotor para ler as acusações, chama o advogado de defesa para dizer como se posiciona, chama o promotor para pedir a pena desejada, e pronto, dá um parecer. Pá pum.

– Você conseguiu falar com alguém de lá hoje?

– Falei com uma atendente, que me esclareceu algumas coisas.

– Eu poderei visitá-la?

– A prisão tem política de visitação, mas o juiz vai definir na audiência se ela terá essa regalia.

– Eu preciso visitá-la, por favor, faça com quem permitam, eu preciso vê-la, preciso saber se ela está bem.

– Verá depois de amanhã, no tribunal.

– Eu posso participar da audiência?

– Pode, mas lá atrás, na bancada.

– Posso falar com ela?

– Não, mas pode me dar algum recado, eu terei algum tempo a sós com ela antes da audiência.

***

– Venha, vou te apresentar para nosso grupo. – Yulia puxou Sam pela mão, sendo seguida por Carmen.

Chegaram numa das mesas do refeitório, onde um grupo de seis mulheres conversavam e jogavam baralho.

– Meninas, essa é a Samantha, ela veio da Nova Capital e é novacapitalense.

– Americana, quem é da Nova Capital é chamado de americano. – Sam a corrigiu.

– Ah, entendi. Bom Samantha é americana. Tem outras americanas na prisão?

– Tem o grupo das gringas do basquete. – Uma senhora de idade respondeu, sem tirar os olhos das cartas em suas mãos. – Ficam geralmente na quadra de basquete.

– É verdade! Samantha, eu vou encontrar seu grupo hoje, prometo!

– Pode me chamar de Sam.

– Ok, Sam de Samantha. – Riu.

– Você não tem sotaque americano. – Uma garota de cabelos loiros e curtos constatou.

– Sou inglesa, mas estava morando…

– Minha madrasta é inglesa, aquela vaca. – A loirinha interrompeu.

– Inglesas não costumam vir para cá, o que você aprontou? – A senhora questionou.

– Eu… Na verdade ainda não sei, não falaram ainda. Eu era militar, talvez tenha algo a ver com meu tempo no exército europeu.

Todas as detentas olharam para Sam com aquela informação.

– Militar? – A senhora perguntou. – Você é uma deles?

– Não mais, eu deserdei ano passado. Quer dizer, retrasado.

– Sente-se.

Sam estava cautelosa, avaliou primeiramente a natureza dos olhares que recebia, acabou sentando à mesa.

– Sophia, prazer. – A senhora de longos cabelos grisalhos presos num rabo de cavalo a cumprimentou, parecia ser uma espécie de liderança naquele grupo.

Sam estendeu sua mão, e na sequência todas também se apresentaram. A loira de cabelos curtos chamava-se Nira.

– Sophia, você explica melhor do que eu sobre as gangues, eu sempre me enrolo, pode explicar para ela?

– Grupos, nós devemos falar grupos.

– Ah, é! Eu esqueço disso. – Respondeu Yulia, dando um tapa na testa.

– Seu nome é Samantha, certo? Do que?

– Samantha Cooper.

– Católica?

– Sim.

– Heterossexual?

Sam levou três segundos hesitantes para responder.

– Não.

– Então não deve ser simpatizante de grupos fascistas, certo?

– Não, não sou.

– Trabalha com tráfico?

– Não.

– Não é negra nem asiática, pelo que percebo. É cigana? Ou transexual?

– Não. Por que estas perguntas?

– Estou tentando encontrar qual o melhor grupo para você se encaixar.

– Posso não pertencer a um grupo?

– É perigoso, aqui dentro é bom fazer parte de algum agrupamento, e acho que as gringas não irão te aceitar porque você é inglesa.

– Posso ficar no grupo de vocês?

– Não, somos o que chamam de grupo deformado, e você não se encaixa.

– Grupo deformado?

Foi então que Sam percebeu que Sophia não tinha ambas as pernas do joelho para baixo, Nira não focava o rosto de ninguém quando falava e olhava sempre algum ponto perdido no chão, Carmem era muda, e possivelmente Yulia tinha algum problema mental. As duas mulheres do outro lado da mesa estavam em cadeiras de rodas.

– Todas nós temos algum probleminha, o meu está aqui. – Yulia contou rindo, apontando para a própria cabeça.

– Eu me encaixo. – Sam disse e ergueu a calça na perna esquerda. – Eu não tenho a perna.

Sophia aproximou olhando atentamente sua perna mecânica.

– Isso é coisa de primeira, como conseguiu? – Perguntou radiante.

– É do exército, eles causaram a perda, eles colocaram outra no lugar.

– Você não prefere um grupo mais forte? Posso tentar negociar com o grupo das americanas. – Sophia disse. – Ou quem sabe o grupo das crentes, elas se enfurnam na capela o dia inteiro, lá não faz frio.

– Minha namorada não enxergava, voltou a ver há pouco tempo, eu tenho experiência com deficientes visuais.

– Pode falar cega mesmo, viu? – Nira disse.

– Escute, eu não sei se realmente ficarei aqui, acho que sairei em breve, eu só quero me manter segura.

– Samantha, alguns grupos aqui tem mais… Tem mais prestígio. Nessa hierarquia nós estamos lá embaixo, nosso grupo é quase invisível, não temos status nem poderes. – Sophia explicava.

– Não quero prestígio.

Sophia olhou para todas as mulheres na mesa, fazendo uma consulta silenciosa. Todas balançaram a cabeça de forma positiva.

– Nira, tudo bem por você? – Sophia perguntou.

– Por mim sim, mas aqui dentro você não será Sam, porque já temos uma Sam, a Samira aqui. – Apontou para uma mulher negra de aproximadamente 50 anos ao seu lado.

– Podem me chamar de qualquer coisa. – Sam sorriu, pela primeira vez nos últimos dias.

– Mas fique sabendo que você pode ser recrutada a qualquer momento, os grupos mais influentes não nos respeitam, podem querer que você trabalhe para eles, ou faça coisas.

– Que grupos são esses?

– Principalmente a Bratva, formada por membros de uma facção criminosa de Moscou, e o Força Branca, um grupo nazista. Elas mandam no pedaço. – Nira explicou.

– E melhor não espalhar por aí que você curte garotas. – Sophia completou.

– Elas odeiam homossexuais?

– O grupo nazista odeia, já a Bratva pode te obrigar a se prostituir. – Nira disse.

– A Anya também é como você. – Sophia apontou para uma mulher na cadeira de rodas, aparentava 45 anos e semblante apático. – Mas nunca mexeram com ela, Anya tem uns problemas nos ossos e nas juntas, e sempre ficou na dela.

– Eu vou ficar na minha. – Sam disse com convicção.

– Por que você acha que sairá em breve?

– Tenho um equipe grande de advogados, sei que devem ter contratado todos os advogados possíveis para me ajudar.

– Então você tem grana? – Sophia perguntou.

– Eu não tenho, mas minha namorada tem.

***

Na tarde seguinte Stefan comia hambúrgueres no quarto de Theo, ambos faziam pesquisas sobre a legislação europeia e esgravatavam o passado de Sam, em busca de algum indício das acusações.

– Eu não posso comer porcarias. – Theo reclamou enquanto comia com desgosto seu cheeseburguer.

– Temos que economizar. – Stefan respondeu fitando a tela holográfica a sua frente.

– Eu tenho intolerância a mil coisas, e estou perdida com meus remédios, preciso cuidar da alimentação.

– Amanhã você come uma salada.

Seu comunicador tocou e era Letícia.

– Theo, que história é essa de Sam presa na Sibéria?? – Vociferou.

– Como soube?

– Falei com Maritza agora, por que não me contou?

– Porque vocês estão viajando em lua de mel, não queria estragar.

– O que aconteceu?

Após cinco minutos relatando como chegara naquela situação, Letícia decidiu viajar para a Sibéria assim que chegassem na Nova Capital, adiantaria seu retorno da Austrália.

Mais tarde à noite, foi a vez de Michelle ligar com preocupação.

– Mas eu tentei falar com você, senadora, me disseram que você estava viajando com a família. – Theo justificava.

– Sim, eu tirei três dias para descansar antes de iniciar esse ano eleitoral, mas poderia ter deixado recado com Fibi.

– Eu falei com Fibi, disse que precisava falar com você.

– Eu não li nos relatórios diários dela, passei batido ou ela achou que não era importante. Ok, mas me explique o que exatamente vai acontecer agora.

– Amanhã de manhã será a audiência preliminar, saberemos dos crimes que a acusam.

– E depois? Ela continuará presa?

– Provavelmente sim, eles não costumam fixar fiança para militares.

– Você está sozinha ai na Sibéria?

– Não, Stefan, um dos conselheiros da Archer e que também foi roubado está aqui comigo, ele será o advogado de Sam.

Michelle ficou em silêncio por alguns segundos antes de voltar a falar.

– E se Sam for condenada?

– Ela é inocente, seja lá do que estejam acusando.

– Eu entendo que Claire tenha agido por ambição por isso te roubou a Archer, mas por que ela fez isso com a Samantha?

– Não sei, talvez para me atingir.

– Você me disse uma vez que ela tinha uma queda pela Sam.

– Era encenação da Claire, não acho que ela realmente sinta algo.

– Essa história tem muitas pontas soltas, ainda não entendo todos os motivos dela. Você não acha que ela está escondendo coisas de você, Theo?

– Acho, mas não faço ideia do que, e nem Stefan.

– E quem é esse homem aí com você? É confiável?

– Michelle… Eu não sei em quem confiar, mas preciso dar um voto de confiança para ele, Stefan também perdeu tudo, está em situação semelhante.

– Assim que for possível irei até aí, ok? A campanha começou agora e já está infernal.

– Estou bem, não se preocupe. Letícia disse que virá em breve.

– Também irei até aí ajudar no que for possível dentro da minha influência.

– Obrigada, eu ainda não faço ideia dos rumos que isso tudo vai tomar. – Theo caminhou até a janela, de forma desolada. – Meu maior medo é que ela fique presa por muito tempo.

– Existe a possibilidade, mas não pense nisso agora.

***

Saíram de Krasnoyarsk cedinho, ainda escuro, e chegaram no tribunal de Novosibirsk por volta das dez. Stefan fora chamado numa sala vazia, com mesa e duas cadeiras, minutos depois Sam entrou acompanhada de um guarda. Ela trajava o uniforme da prisão, camisa de botões azul e calça também azul. Mãos e pés acorrentados. Stefan estava num terno impecável com gravata verde.

– Stefan?? – Estranhou ao vê-lo.

– Voltarei em vinte minutos para te buscar. – O guarda disse e saiu.

– Olá, Samantha, sente-se.

– Foi você que me mandou para a prisão, não foi? – Sam disse na defensiva, ainda de pé.

– Eu sou seu advogado de defesa, temos apenas vinte minutos para que você me explique as possíveis acusações, e eu te explicar o que de fato aconteceu com você e Theo.

O semblante de Sam mudou para pura preocupação.

– O que aconteceu com Theo? Stef, o que aconteceu com ela?

– Em primeiro lugar, ela está bem, nosso foco hoje é você.

– Mas o que aconteceu com ela? E onde estão os advogados da Archer?

– Claire traiu vocês, durante todo esse tempo você foi ingênua o suficiente para acreditar nas boas intenções dela e assinar uma pilha de coisas sem saber o que estava fazendo. Theo perdeu tudo, a Archer e todos os bens, tudo agora pertence a Claire. Que também roubou tudo de mim.

Sam finalmente sentou-se à sua frente, parecia completamente perdida.

– Theo perdeu tudo?

– Sim, estamos na miséria.

– Meu Deus… – Olhou com desespero o tampo da mesa, com as mãos na cabeça. – E por culpa minha.

– Sim, culpa sua, mas precisamos ser práticos agora. Eu já dei entrada num processo de recuperação dos bens e anulação de tudo que ela fez em nosso nome, mas sequer protocolaram ainda. Claire deve ter comprado um exército inteiro para nos derrubar e evitar uma revanche nossa.

– Theo deve estar possessa comigo… Eu a fiz perder tudo, ela nunca vai me perdoar, eu… Arruinei tudo, ela está pagando pela minha estupidez. – Sam desesperava-se.

– Sam, você cometeu algum crime?

– Que?

– Por que te prenderiam?

– Não sei! Stef, como Theo está sobrevivendo?

– Ela vendeu algumas coisas da casa, está num hotel e está confortável. Mas responda minha pergunta, tenho que formular sua defesa e nem sei do que te defender.

– Eu não fiz nada, eu não cometi nenhum crime, talvez tenham revogado minha anistia pela deserção do exército.

– E por que te trariam para esse iceberg em terra firme?

– Porque o vice-diretor do presídio é o pai de Mike, o Coronel Phillips, essa é a única explicação.

– O pai do seu ex-noivo?

– Sim! Ele pode estar por trás disso. Temos como derrubar isso, não temos?

– Samantha, você compreende que seu único advogado é alguém que não pratica a advocacia há décadas? Estou fazendo meu melhor, mas me sinto defendendo no escuro, temos que aguardar as palavras do juiz, e então traçarmos uma estratégia. Mas saiba que você continuará presa até o dia do julgamento, que ainda não tem data.

– Nada de fiança?

– Não, você precisa se preparar para passar um tempo na prisão, então seja forte e focada.

– Você está em contato com Theo? Ela falou algo?

– Ela está aqui.

– Theo veio para a Sibéria? – Perguntou incrédula.

– Sim, viemos para cá no dia seguinte, estamos numa cidade distante 700 quilômetros daqui, num hotel.

– Ela não está brava comigo?

– Não, ela está apenas preocupada com você.

Sam abriu um sorriso torto e esperançoso.

– Eu a verei?

– A distância, ela está no auditório de espectadores, vocês não terão contato.

– Você pode pedir desculpas em meu nome? Por favor, diga que eu não fiz nada de forma intencional, eu fui enganada. Eu realmente sinto muito, Stef, eu nunca vou me perdoar por estar novamente fazendo mal a ela, que nunca me fez mal algum.

– Theo pediu que eu dissesse a você que ela está bem, que considera apenas a Claire culpada disso tudo, e que vai dar um jeito de tirar você daqui.

– Eu quero ir embora daqui, e com ela. – Sam quase chorava.

– Ela também pediu que dissesse que a ama muito. – Stefan disse sem jeito.

– E eu a amo ainda mais. Você pode dizer isso a ela?

– Saiba que não ficarei de pombo correio do amor entre vocês, ok? Tenho mais o que fazer.

O guarda a retirou ali, Stefan também precisou se retirar, voltando a ficar ao lado de Theo nas cadeiras do auditório. O tribunal era mobiliado e ornamentado por algum tipo de madeira clara, havia uma grade separando as cadeiras em declive da área da tribuna.

– Processo número 216117706, ré Samantha Cooper, advogado Stefan Morris, promotor Anthony Cox. – O juiz com aparente cansaço e idade avançada os chamou.

O guarda conduziu Sam por uma porta lateral, a instruindo a sentar-se numa cadeira dentro de um cercado baixo. Ignorou as ordens e ficou de pé procurando Theo no auditório, que estava quase cheio.

– Sente aqui, senhora. – O guarda insistiu, sentou-se após encontrar o olhar tenso e azul de Theo.

O juiz leu de forma rápida as instruções em seu papel, despertando a atenção de Sam, que o fitou pela primeira vez.

– A Força Militar da Europa, representada pelo Estado Maior da Europa, e pelo promotor aqui presente, acusam a ré Samantha Cooper de dois crimes contra o exército e um crime de guerra. Acusação de número um: deserção sob motivo fútil ou leviano, com pena cabível de 2 a 4 anos de reclusão. Acusação número dois: furto de equipamentos pertencentes ao exército, os quais foram implementados em seu corpo, com pena cabível de 8 meses a 1 ano de reclusão. Acusação número três: assassinato em massa de civis num ato militar em março de 2118, na Zona Morta, com o saldo de 14 mortos, sendo a acusação de homicídio doloso, o qual a ré sabia que suas ações poderiam resultar na morte de civis. Pena de 3 a 5 anos de prisão, por cada morte. Como a ré se declara? – O juiz interpelou Stefan, que estava de pé solitário num banco de frente para a tribuna do juiz.

– Meritíssimo, tomamos conhecimento das acusações neste momento, solicitamos o cancelamento desta audiência para que possamos analisar todas as acusações. – Stefan respondeu nervosamente. Sam e Theo mal respiravam.

– Pedido negado. Como a ré se declara das três acusações?

Stefan lançou o olhar para Sam, que apenas o fitava em pânico, suas pernas amoleceram. Balançou a cabeça negativamente para Stefan.

– A ré se declara inocente de todas as acusações, meritíssimo.

– O que a promotoria solicita? – O juiz perguntou ao defensor público, um homem de cabelos cobreados de aparentes 50 anos.

– O Estado Maior da Europa solicita a pena máxima para o crime de deserção, pena máxima para o crime de furto, e pena máxima para o crime de guerra.

– Este tribunal declara que todas as acusações foram aceitas. – O juiz disse sem titubear. – E solicitamos que a ré retorne à prisão militar de Krasnoyarsk, permanecendo em regime fechado até a data do julgamento, a marcar. Solicitamos também que a ré tenha o direito à visita semanal de 50 minutos, e que o tempo transcorrido até a data do julgamento abata de sua possível pena a cumprir. Por último, esta corte demanda a devolução de todos os itens furtados, os que não causem seu óbito com a retirada, e que segundo o relatório anexado corresponde a uma prótese colocada no lugar de sua perna esquerda. Audiência do caso 216117706 encerrada. – Disse e bateu com o martelo de madeira numa base sobre sua mesa. – Podem levá-la.

 

Condescendente: adj.: Em que há abertura para ceder às vontades ou às opiniões dos outros, ainda que estas não representem os próprios princípios;  Particularidade de alguma coisa ou de algum indivíduo que possui flexibilidade, tolerância ou incapacidade impor ou ser autoritário.

4 comentários Adicione o seu
  1. Oieee!!
    75 anos? Me perdi…..fiz as contas e n chegou nem perto disso! kkkkk
    Quase tive um surto c esse julgamento! !
    Ótimo capítulo, gostei muito!!
    Beijos

  2. Nossa quanto sofrimento!!! Realmente não tinha um lugar mais frio pra mandar a Sam. Se a justiça lá for como a nossa do século XXI a Sam não sai antes de completar 70 anos. Ansiosa pelo próximo capítulo. Bjs.

  3. Olha não esperava por essa, Sam perder a perna??? Achei o máximo e mt chocante. Amo a personagem, mas amo mais ainda ser surpreendida na leitura.

    Correndo aqui para o próximo, vão me chamar de doente, mas feliz com a perda da perna, vai ter um Up incrível.

    Sei que no fundo Sam é incrível e vai surpreender.

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