2121 – Capítulo 38

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Capítulo 38 – Quixotesco

 

– Tem uma ali, acabei de encontrar.

– Você disse que estava nublado.

– Sim, mas acho que alguma nuvem abriu, porque estou vendo uma.

– Deve ser um pássaro.

– Um pássaro espião?

– É.

– Não, não é um espião, nem um satélite, nem um poste flutuante. É uma estrela.

Sam insistiu, mas de forma tranquila. Estava ainda sentada no fundo da caminhonete, agora com Theo sentada a sua frente, entre suas pernas, recostada tranquilamente em seu peito.

– Igor, é uma estrela? – Theo o incluiu na conversa.

– Onde? – Ele voltava do barco, com as calças molhadas do mar.

– Aponte para ele, Sam.

– Ali. – Sam apontou para o alto.

– Eu gostaria de acreditar que é uma estrela, e não um pássaro. – Igor disse, após fitar o céu. – Acho que é uma estrela.

– É pequena? – Theo voltou a falar de forma intimista com Sam.

– Vou medir. – Sam estendeu a mão a frente dos olhos. – Tem dois centímetros.

– É enorme.

– Talvez seja um planeta.

– Poderíamos fugir para lá. – Theo sugeriu.

– Deve ser pequeno demais para nós duas.

Silêncio.

– É verdade.

– Arranjaremos um cantinho por aqui mesmo, tudo bem?

– Desde que você esteja nesse cantinho.

– Estou por sua conta. – Sam a abraçou mais forte, lhe beijando abaixo da orelha. – Está quase na hora.

– Já?

– Uhum.

– Desculpe interromper alguma coisa importante que vocês estejam fazendo, mas acho que podemos começar a guardar as coisas e fechar o carro. – Igor disse.

– É o que faremos. – Theo respondeu.

– Que venham as matrizes! – Sam exclamou ao descer da tampa da caminhonete, afundando os pés na areia grossa.

Minutos depois o trio já navegava pelas águas escuras e agitadas, na direção da Ilha das Peças, na direção do sonho de uma segunda chance. Já estavam na metade da travessia, Sam conversava com Igor dentro da pequena cabine de comando, Theo viajava do lado de fora, sentada na lateral do velho barco azul e marrom, que usava madeira em parte de sua composição.

– O barco está aguentando bem. – Sam comentou, precisava segurar-se nas laterais da cabine, por conta do forte balanço das ondas.

– Chegaremos em menos de vinte minutos. E não se preocupe, o capitão aqui sabe conduzir alazões de todos os tamanhos. – Igor sorriu convencido.

– Ok, capitão dos sete mares, estarei lá fora, me chame se precisar de auxílio profissional.

Sam sentou-se ao lado de Theo, que tentava prender seu cabelo, mas a falta de mobilidade na mão esquerda e o vento forte dificultavam.

– Eu te ajudo. – Sam tomou o elástico e ajudou a prender seu rabo de cavalo, mas o elástico saltou para longe.

–  Ops. – Sam assistiu o elástico pulando para o mar.

– O que foi?

– Acho que se foi.

– Deixa para lá.

– Depois arranjo outro para você.

– Tem outro na minha bolsa.

– Tem?

– Peguei da sua bolsa. – Theo falou com um sorrisinho.

– Você precisa… – Sam foi interrompida por Igor, que saiu com semblante assustado de dentro da cabine.

– O que foi? – Sam perguntou, sem entender.

– Tem um barco se aproximando, está com as luzes apagadas, não é bom sinal.

Sam levantou-se rapidamente, e conduziu Theo para a cabine.

– Fique aqui dentro e mantenha-se abaixada, ok? – Sam a orientou, fechando a portinhola da cabine.

– Está com suas armas? – Igor perguntou, já abaixado, de olho no barco que se aproximava.

– Estou. Desligou todas as luzes? – Sam abaixou-se ao seu lado, espiando.

– Sim. Talvez sejam apenas pescadores, mas é melhor não arriscar, esteja preparada para revidar.

– Não poderíamos tentar uma fuga?

– Nessa lata velha? A única fuga que conseguiria seria para o fundo do mar. Teremos que enfrentar, seja o que for, e parece bem maior que o nosso.

O mar continuava revolto, com ondas que jogavam a pequena embarcação precária de um lado para outro como se fosse um barquinho de papel, o céu nublado e a ausência das luzes do barco deixava tudo ainda mais angustiante. Sam continuava espiando por cima da lateral do barco, com a arma em punho, sua respiração cada vez mais forte, e a sensação que algo ruim estava prestes a acontecer subia por sua espinha.

A embarcação que se aproximou tinha o dobro do tamanho do barco azul, era branca e moderna, a movimentação de alguns homens já podia ser vista.

Do alto do deque frontal, um canhão de luz foi apontado para o pequeno barco, o iluminando de ponta a ponta, a procura dos tripulantes. Igor ergueu-se, prontificando-se.

– Posso ajudar em alguma coisa? – Ele enrolava lentamente uma corda ao redor do braço, simulando ser um pescador em trabalho.

– Quem está com você? – Um homem barbado foi até a frente do deque e indagou Igor, olhando atentamente para o interior do barco.

– Apenas nós dois. – Sam ergueu-se também. – Precisam de alguma coisa?

O homem continuava olhando atentamente para o interior do pequeno barco, enquanto outro homem ao seu lado movia o canhão de luz de um lado para outro.

– Estão indo para onde?

– Estamos pescando. – Igor respondeu.

– Você e a mulher?

– Sim, é minha esposa.

Sam contou a presença de três homens no barco, o interlocutor e o que manobrava o canhão, no deque; e um outro de braços cruzados ao lado da cabine. Lutava para se manter de pé enquanto tentava manter a calma, ainda não sabia das intenções daquele outro barco.

– Hum. Só vocês dois então? – O homem barbado certificava-se, olhando atentamente.

– Sim, apenas eu e meu marido. – Sam confirmou, se aproximando de Igor.

– Sei… A garota ficou onde? – Ele perguntou, pegando ambos de surpresa.

– Que garota? – Sam respondeu nervosamente.

– Onde está a garota?

– Senhor, apenas nós dois costumamos sair para pescar, não temos filhos nem ajudantes. – Igor respondeu.

– Onde deixaram a garota?

A dupla fez um silêncio hesitante, sem saber o que responder. Haviam sido descobertos, o teatrinho não era mais necessário.

– Ficou em terra firme. – Sam respondeu.

– Onde?

– No cais. – Sam falava em voz alta.

– Vocês dois estão indo para a Ilha das Peças?

– Sim.

O homem coçou a barba, e deu um tapinha no ombro do iluminador, para que desligasse o canhão de luz.

– Certo, boa viagem para vocês. – Ele finalizou, e gesticulou para o homem ao lado da cabine, girando o dedo indicador.

Ambos entraram na cabine e o barco branco começou a mover-se. Sam e Igor acompanhavam apreensivamente o movimento do barco, contornando devagar.

Já do outro lado, o barco desacelerou, e o homem que antes manobrava a luz, foi até a proa, atirando algo na direção do barco azul.

– Granada! Pule! – Igor gritou, tomando Sam pelo braço.

– Não!

A granada explodiu no meio do barco, fazendo um grande estrago no assoalho e nas laterais, quase o partindo ao meio, haviam pedaços de madeira e do casco ainda caindo do céu.

– Theo! – Sam bradou em desespero, indo na direção da cabine.

Antes que chegasse ao destino, outra granada foi atirada, caindo ao lado da cabine.

– Sam, não! – Igor a puxou pelo braço, e pularam do barco.

A granada explodiu de imediato, fragmentando o barco em partes de tamanhos variados. Alguns pedaços e partes afundaram rapidamente, a explosão atirou a dupla no mar no momento em que pulavam, caindo distante dos destroços.

Sam nadou rapidamente e logo veio à tona, aguardava ansiosamente que Igor e Theo também emergissem naquele mar negro. Segundos depois Igor surgiu, com um corte no rosto sangrando em abundância.

– Onde ela está? – Sam gritou desesperada.

Igor ainda se recompunha da explosão, olhou para todos os lados, procurando por sinal de Theo.

– Igor, onde ela está? Onde Theo está??

– Não sei, eu não sei!

– Ela afundou? – Sam nadou avidamente na direção de Igor.

– Talvez sim. Calma, vamos encontrá-la. – Ambos se esforçavam para manter suas cabeças fora da água, as ondas os encobriam o tempo todo.

Sam nadou entre os escombros, pedaços de madeira boiando, partes do motor do barco, do casco laminado, objetos, um sem número de coisas boiavam por uma vasta extensão ao redor deles.

– Ela pode ter desmaiado com a explosão. – Igor disse, também nadava desesperadamente a procurando.

– E está se afogando! Eu vou mergulhar. – Sam resolveu.

– Você não vai enxergar nada!

– Ela está submersa, Igor! Eu vou buscá-la, com ou sem você!

Igor a fitou confuso.

– Ok, eu vou mergulhar também, procure deste lado, eu vou procurar por lá. – Igor apontou para o lado oposto, onde haviam mais escombros.

Sam tomou fôlego e mergulhou na água negra e gelada, não enxergava nem um palmo a sua frente, seus braços seriam seu radar.

Ficou o quanto pode submersa, a procurando desesperadamente. Subiu tomando ar, e procurando visualmente por algum sinal dela. Igor surgiu em seguida, a fitou esperançoso, mas Sam moveu a cabeça negativamente.

– Tente ir mais ao fundo! – Igor a aconselhou, e ambos mergulharam novamente.

Sam deslocava-se freneticamente dentro das águas, esbarrava em pedaços do barco, e por um pequeno momento enchia-se de esperança. Ambos emergiram quase ao mesmo tempo, e os mesmos semblantes curiosos transformavam-se em aflição novamente, ao ver a ausência de resultados.

– Vou varrer este lado! – Sam bradou, apontando para um lado onde haviam pedaços de madeira.

– Procure cada vez mais no fundo.

Antes de mergulhar novamente, Sam hesitou, fitando Igor,

– Não desista de procurar, por favor. – Sam implorou de forma angustiante.

– Não vou desistir, mas tenha ciência que já se passou um bom tempo.

Sam respirava rápido, agora com dificuldade com o nó que se formava em sua garganta.

– Eu sei.

Sam encheu os pulmões e mergulhou, cada segundo dispendido poderia ser o segundo que decidiria entre a vida e a morte.

Seguiu a orientação de Igor, mergulhando cada vez mais profundamente, seu fôlego já estava menor, estava cansada, e suas investidas profundas estavam se tornando perigosas, pois forçava-se a continuar submersa mesmo sentindo seus pulmões colapsarem.

Deslocava-se em círculos pelas águas frias, já não encontrava destroços, seus braços movimentavam-se agora sem encontrar nenhuma resistência além do mar. Seus pulmões avisaram, sua mente avisou, e agora sentia-se zonza enquanto voltava a superfície. No caminho esbarrou em algo, tateou e foi como se a água gélida se tornasse morna, era um corpo de alguém, era o corpo de Theo.

Abraçou firmemente com um braço, e com o outro nadava para cima, logo chegou à tona e buscou o ar que parecia não ser o suficiente.

– Achei. Achei. – Balbuciou com esforço.

Tentava manter o rosto desacordado de Theo para fora da água e das ondas, Igor surgiu segundos depois, e nadou com pressa até ela.

– Deixe comigo. – A tomou nos braços, a examinando de perto.

– Ela está respirando? – Sam perguntou, com a mão em sua nuca.

– Não sei, acho que sim. Temos que sair da água.

– Onde está a margem?

Igor olhou ao redor, conseguiu localizar a baia mais próxima, na ilha, imaginando o quanto restava até lá.

– Sam, você tem fôlego para nadar? Acho que temos uns três ou quatro quilômetros de mar pela frente.

Sam não respondeu de imediato, parecia transtornada com a visão de Theo desacordada, com a cabeça pendendo para trás. Olhou para a enseada e calculou a distância.

– Um pouco mais, 4,2 quilômetros. Sim, eu tenho fôlego, eu a carregarei.

– Não, deixe comigo.

– Revezaremos, me entregue dentro de um quilômetro. – Sam disse incisiva.

– Pensarei no seu caso. Vamos.

Igor passou seu braço por cima do peito de Theo, e nadava devagar, a carregando com o cuidado de manter sua cabeça para fora da água. Sam acompanhava no ritmo dele, ao seu lado.

A maratona de natação era extenuante e penosa, agora era Sam que carregava Theo, seus braços doíam e suas pernas tinham câimbras, mas a dupla seguia sem silêncio, compenetrada.

Mais um trecho vencido, e novamente a troca foi feita, Igor recebeu Theo e encarou Sam.

– Quer descansar? Você não parece bem.

– Não podemos descansar, Igor, eu não posso… Eu não posso descansar. – Sam arfava.

– Ok. – Igor ajeitou Theo em seu abraço. – Aguente firme, mocinha tatuada!

Seguiram nadando reunindo suas últimas forças, o mar continuava difícil e agitado, algumas ondas os arrastavam por metros. Chegaram exaustos à praia, uma baia deserta apenas com vegetação densa após a faixa de areia.

Igor arrastou Theo até onde o mar não alcançava, a deitando na areia. Sam ajoelhou-se ao seu lado, com a respiração pesada. Igor abaixou-se, não ouviu sua respiração.

– Acho que ela parou de respirar. – Igor começou uma massagem cardíaca, ele também parecia exaurido.

– Deixe comigo. – Sam disse apreensiva.

– Não. Um… Dois… Três… Vamos lá. Vamos lá. Cinco… Seis…

Tentou respiração boca a boca, Theo permanecia inerte, para desespero de Sam. Após algumas seções, Sam afastou as mãos de Igor, e começou sua sequência cardíaca e de respiração boca a boca.

Não houve resultado, e Igor assumiu a ressuscitação novamente. Sam acompanhava com aflição cada movimento, e ficava cada vez mais pessimista com o passar do tempo.

– Theo, você já venceu coisa pior, pelo amor de Deus, acorde. – Sam pedia.

Sam observou com angústia a mão esquerda enfaixada de Theo, com as ataduras molhadas, o cabelo solto que não conseguira prender, a regata branca que ela gostava de usar porque exibia suas tatuagens.

– Meu Deus… Não a deixe morrer, por favor. – Sam murmurou.

Igor cessou os movimentos, aproximou-se dela, tentando ouvir alguma respiração. Sam a fitou e pousou a mão em sua testa.

– É bom você acordar, está ouvindo, Theodora?

– Chegue para lá, vou tentar novamente. – Igor disse.

Enquanto Igor fazia respiração boca a boca, finalmente o corpo de Theo contorceu-se, colocando para fora uma boa quantidade de água. Igor a colocou sentada, a abraçando, para que expelisse mais água. Theo permanecia com a cabeça caída sobre o ombro de Igor, de olhos fechados, mas agora respirando, os cabelos molhados cobriam parcialmente seu rosto.

– Theo? Você me ouve? Theo? – Sam a fitava, tirando seus cabelos do rosto.

– Ela vai ficar bem. – Igor disse, com um sorriso satisfeito.

– Theo? Acorde, meu amor. – Sam insistia, ainda apreensiva.

Theo abriu os olhos, mas não esboçou reação, estava inerte nos braços de Igor, com seu rosto caído em seu ombro.

– Ela deve ter desmaiado com a explosão da granada. – Igor disse.

– Me dê ela aqui. – Sam estendeu os braços, e Igor lhe entregou Theo, que ainda não reagia.

– Ela vai se recuperar aos poucos. – Igor disse, levantando-se da areia.

– Hey, você me ouve? – Sam ergueu com cuidado o rosto de Theo, a fitando.

Theo balançou a cabeça devagar, de forma afirmativa.

– Você está bem? Dói em algum lugar?

Theo não respondeu.

– Eles voltarão. – Igor bradou, olhava para o horizonte, procurando algum sinal dos homens.

– Você acha que foram para o cais? – Sam repousou Theo na areia, ficando ajoelhada ao seu lado, sentada sobre as pernas.

– Acho que sim, mas talvez voltem, por isso precisamos sair da praia, podem nos ver daqui.

– Theo? – Sam abaixou-se, colocando a mão no rosto dela. – Me ouve?

– Sim. – Theo abriu os olhos e respondeu baixinho.

– Nós precisamos sair da praia, estamos visíveis, tudo bem se te carregarmos para dentro da mata?

– Ok, acho que consigo levantar.

Mas ela não conseguiu.

– Tudo bem, deixe comigo e com Igor.

– Como ela está? – Igor se aproximou, inclinando-se sobre Theo.

– Acordada.

– Temos que nos esconder.

– Eu sei, me ajude com ela.

Igor tomou Theo nos braços e a colocou sobre o ombro. Deixaram a praia e o forte vento que agitava as árvores, já caminhando pela vegetação fechada, repleta de galhos e arbustos, além da escuridão.

– Igor… Igor… – Theo o chamava.

– O que foi?

– Eu quero descer, já posso andar.

Igor olhou para Sam, a consultando.

– Ok, a coloque de pé.

Theo cambaleou, sendo amparada por Sam, que a segurou a abraçando.

– Você nem fica de pé. – Sam disse.

Theo fitou um ponto qualquer no nada, franzindo as sobrancelhas.

– O que aconteceu? Onde estamos?

– O barco explodiu, estamos na ilha. – Sam respondeu.

– Como chegamos aqui?

– Nadando.

– Eu nadei?

– Não, você estava desacordada. Veio de carona.

– Hum. Acho que me afoguei.

– Se afogou sim.

– Eles acham que estou no cais, não é?

– Você ouviu a conversa com eles?

– Ouvi. Eles já devem ter voltado para a ilha.

Sam olhou para Igor, ainda não haviam decidido o que fazer.

– Quer se esconder por um tempo? – Igor a questionou.

– Não, quero ir em busca do laboratório, e torcer para que eles não nos encontrem.

– E suas armas?

– Estou com minha pistola, e você? – Sam deu um tapinha na arma presa a perna.

– Uma arma e uma adaga na bota.

– E você, Theo?

– Ãhn, eu esqueci minha arma no carro.

– Tudo bem, vamos andar na direção da construção que vimos pelas imagens de satélite.

– Estamos sem comunicador, não sei onde estamos, vamos andar a esmo pela mata? – Igor questionou.

– Não, eu tenho alguns implantes de geolocalização, estamos na parte sudeste da ilha, temos que seguir neste rumo. – Sam apontou para o lado.

– Adoro seus implantes, se fizessem café seriam perfeitos. – Theo brincou.

– Você já está bem, não é? – Sam soltou-se de Theo, a fitando.

– Estou ótima, pode me soltar, consigo caminhar. – Theo soltou-se e tropeçou num galho.

– É, ótima.

– Pisei em algo.

– Ok, vamos andando. – Sam tomou a mão de Theo e iniciaram a caminhada.

– Até lá deve ter no máximo dois quilômetros, mas no meio dessa floresta macabra e cheia de galhos, vamos levar algum tempo. – Igor reclamava, arrancando os galhos que apareciam a sua frente.

– Como nos acharam? – Sam tentava entender o que havia acontecido.

– Acho que não era uma estrela. – Theo murmurou.

– Algum pássaro ouviu nossas conversas. – Igor disse.

– Ou seus colegas de resistência nos deduraram.

– Duvido que tenham feito isso.

– Essas coisas não costumam acontecer na resistência, Sam. – Theo corroborou com Igor.

– Bom, algo ou alguém nos entregou. Tronco a frente, cuidado.

– Ai. – Theo tropeçou no tronco, caindo de joelhos.

– Machucou? – Sam perguntou, solicitamente.

– Não.

– Avisarei com mais antecedência, ok?

Continuaram a lenta caminhada em silêncio, entre tantos pensamentos sobre o que aconteceria quando chegassem ao laboratório e preocupações com a segurança do trio, Sam se deu conta que algumas coisas haviam mudado.

Inicialmente pensou ser a situação extrema por qual estavam passando, que colocava seus nervos à flor da pele, mas num pensamento mais analítico, percebeu que ela havia mudado algumas atitudes. Talvez isso fosse apenas um reflexo de algo maior, o modo como enxergava Theo havia mudado.

– Ainda estou recobrando minha consciência, então tenho uma dúvida: se o barco explodiu, como voltaremos para o cais? – Theo perguntou.

– Poça de lama, cuidado. – Sam a alertou. – No laboratório teremos meios de nos comunicarmos, poderemos contatar algum transporte marítimo.

– Talvez o laboratório tenha algum pequeno helicóptero para emergências. – Igor completou.

– Falta muito? – Theo perguntou.

Sam parou seu passo, semicerrou os olhos fixamente para frente.

– Não, tem algo maciço em duzentos metros.

Despontaram numa área aberta, com gramado e ervas daninhas, Igor e Sam olharam a construção a sua frente, mais ao longe, ambos com semblantes perplexos.

– Encontramos? – Theo perguntou com ansiedade.

– Não pode ser… – Sam murmurou, confusa.

– Talvez seja um disfarce. – Igor tentava entender o que via.

– Não, não acredito… – Sam ajoelhou-se, com a cabeça de lado comtemplava a grande construção, desolada.

– Mas de que raios vocês estão falando? – Theo perguntou sem paciência.

Eles fitavam uma construção larga, de grandes pedras rústicas, parcialmente demolida, parecia um forte de alguns séculos atrás, com entradas em arco.

– É uma construção antiga, em ruínas.

– Um laboratório em ruínas?

– Não, parece um forte do século XVII. – Igor respondeu.

– E onde está o laboratório?

– Não tem laboratório. – Sam fazia a triste constatação, transtornada.

– Pode estar em outro lugar na ilha. – Theo rebateu.

– Não, pelas imagens de satélite só havia uma construção na ilha. E é essa casa velha.

– Não acredito… – Sam levou ambas as mãos à cabeça, com desespero.

– Igor, quem te deu a informação que o laboratório era aqui? – Theo perguntou.

– Um colega de célula, ele disse que essa era uma informação recente, dada por um informante de San Paolo, alguém que já havia dado informações que foram comprovadas. Era informação quente… – Igor também parecia desolado.

– Mentiram para você, Igor, foi informação falsa! – Theo se exaltava.

– Foi informação confiável, Ilha das Peças, é o que o núcleo acabou de descobrir, essa informação ainda não chegou para os operários, isso veio de cima! – Igor esfregou os dedos pelos cabelos. – Não sei… Não sei o que está acontecendo…

– Operários? – Sam perguntou.

– Quem não faz parte do núcleo é chamado de operário. – Theo respondeu.

Os três estavam lado a lado, com suas roupas ainda molhadas e sujas, semblantes desolados e cansados, plantados naquele descampado onde o vento voltava a agitar seus cabelos e roupas. O rosto de Igor tinha alguns vestígios de sangue próximo à testa, Theo parecia ainda não totalmente recuperada do afogamento, e Sam tinha um rasgo em sua camiseta verde musgo, todos tinham arranhões pelo corpo. A caminhada na mata havia desgastado ainda mais o trio, mas a sensação de estarem correndo atrás de moinhos de vento havia sido o golpe mais duro até então.

– Vamos entrar. – Sam interrompeu o silêncio desolador, erguendo-se num rompante.

– Só deve ter pedras aí dentro.

– Eu não quero acreditar que nos mandaram para uma casa de pedras, deve ter algo mais, tem que ter.

– Provavelmente não, mas já que estamos aqui… – Igor disse.

Sam tomou a mão de Theo com firmeza, e seguiu a passos largos na direção da construção cinza, sendo seguida por Igor.

Passaram pela grande porta abaixo de um arco, no interior havia um largo ambiente, com grandes aberturas, onde um dia foram janelas. O chão era de terra batida e não havia nada por ali, apenas alguns grandes ganchos metálicos no teto, e roldanas de ferro, artefatos antigos que deveriam estar ali há alguns séculos.

O interior estava escuro, mas havia alguma visibilidade por conta das aberturas laterais, deveriam haver mais uns três ou quatro ambientes como aquele, que desbravavam devagar, atentamente.

– Nada? – Theo perguntou.

– Talvez alguns fantasmas e aranhas. – Igor respondeu.

– Tem outras salas, vamos. – Sam seguiu para a próxima porta, entrando num ambiente menor.

Sam seguia na frente, conduzindo Theo pela mão, seus olhos tinham uma esperança brilhante, de que encontrariam algo naquele lugar. Igor acompanhava logo atrás, sem pressa.

Haviam duas portas, Sam escolheu a da direita e seguiu com passos firmes e olhar atento, era um ambiente ainda maior e mais iluminado.

– Me desculpem por não ter oferecido uma carona, mas achei que gostariam de nadar um pouco, faz uma noite tão agradável. – O trio assustou-se com a voz grave de uma figura recém conhecida: o homem barbado que estava no barco, com seus dois homens mais à frente, com pistolas apontadas para eles.

 

Quixotesco: P.ext. Irrealista, utópico, sonhador, ao modo de Dom Quixote.

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19 comentários Adicione o seu
  1. Eita que esse suspense me mata… Doida pra ver os próximos passos de sam… Una pergunta: tem alguma chance de Theo voltar a ver???…

  2. Holaaaaa darling! !!
    Capítulo muito bommmm!!!
    Que desespero de Sam quando n pôde buscar Theo e Igor a puxou!! De terror…o único q pensei: mar escuro…tubarao (trnhi pavor s tubarão, n mais q baratas rs).O fato foi que Sam n desistiu. ..foi ate i fim, passou quase seus limites físicos. .Inda bem q ela tq modificada, os sentidos dela ficam mais apurados.
    Que paletada ate o outro lado…veio escroto..desfrutou total! !
    Pena q a missão delas só ta começando. ..o q encontra n é nada gatinho, mas n devemos julgar o livro pela capa é?
    Quem será esse veioo de barba?
    Elias ( )
    Ben( @ )
    Outro?( )

    Para mim papi fui buscar a filha ou matá-la por mãos próprias ja q ng conseguia. Sam nunxa viu o psogro né? Igor tb n conhece. .Então é válido. .senão é outra pessoa….
    Agora veremos se Igor é digno …
    N queri especular mais nada..estamo na reta final, prefiro esperar….
    Lindo finde,
    Beijos

    1. Hola! (não sei, quando falo hola me sinto numa arquibancada de estádio, acho estranho… rs)
      Eu imaginei essa cena no barco tipo assim “volte aqui sua louca” e Igor arrastando Sam para longe da granada pelos braços.
      Sam já viu o sogro por fotos, quando pesquisou sobre Theo, então já podemos descartar essa possibilidade com relação ao homem barbudo.
      Reta finalíssima mesmo, se eu render na escrita termino a história ainda essa semana. Meu Deus, meu coração aperta quando penso nisso.
      Especule, Lai! Quero ouvir suas ideias!
      Bjos!

  3. E eu parei de respirar junto com Theo…

    Gente, que capítulo foi esse?! De tirar o fôlego, literalmente.

    Aquele momento em que você quer estar alí, ajudando Sam a procurar Theo.

    Minhas reações no decorrer da leitura:

    -Ooonnwwt…que lindas.
    -Pqp…vão pegar eles!
    -THEO!
    -Procura mais Sam, rápido minha filha.
    -Acorda Theo, não me deixa nessa aflição criatura.
    -aaah…
    -Ferrou.

    Kkkkk #alouca na frente do monitor.

    Reta final, vamo que vamo 0/

    Bjs.

    1. Confesso que também foi angustiante escrever a cena do afogamento, tenho pavor de me afogar, então acho que estava exorcizando algo… rs
      Temo que suas próximas reações sejam “PQP, morreu”
      Mas saiba que também sou a louca na frente do computador quando escrevo, porque eu enceno a maioria dos diálogos, para pegar os trejeitos e expressões. Não queira me assistir escrevendo.
      Bjos! Obrigada!

  4. OMG! É muita aflição para um capítulo só.Minhas angustia sempre vem qdo Theo está em perigo, e como resta uma morte. Lembro que vc disse que a ultima morte era controversa, então pensei agora, que poderia ser a Theo a vítima, a Sam pensaria que ela tinha morrido, mas na verdade ela seria capturada e transformada num cyborg tipo o nêmesis, mas sem memória e passaria caçar a Sam. Viajei, né?rsrs Notei que a Sam está mais carinhosa e atenciosa com Theo, pq antes qdo Theo se feria ela simplesmente dizia : "vc vai sobreviver", não tinha cuidados com ela, agora não, fica sempre preocupada e cuidadosa. Estou gostando desse lado da Sam. Ela longe de Mike e sem os comentários preconceituosos da irmã, é uma pessoa bem melhor.Estou muito ansiosa para saber o que vai acontecer e quem é esse homem barbado.Bjs Cris.

  5. Esse capítulo foi excelente, adorei o momento contemplativo de olhar o céu e admirar a estrela que poderia ser um drone, uma ironia divertida. rs

    Vivi um momento Grey’s Anatomy com o afogamento, tipo “tá ela não vai morrer agora… Né?”

    Quanto ao pessoal do barco, penso que podem ser do mesmo time do gravata de borboleta, ou tem várias frentes atrás de Theo, basta saber pra quem trabalham, ou se estão apenas atrás de dinheiro, claro que não deve ser apenas dinheiro, eu fiquei pensando que esses poderiam ser parte de um grupo do qual Mike agora faz parte, mas não dá pra saber.

    Adoro esses capítulos com fortes emoções \o/

    Que venha o próximo 😀

    1. Olá Maria Aparecida!
      Eu queria começar o capítulo de uma forma bem tranquila, para contrapor com a aventura que vinha a seguir, daí pensei “qual é a coisa mais pacífica que um casal pode fazer, além de dormir? observar estrelas!”
      É, foi aquele momento que você havia citado, da Meredith quase morrendo e você sofrendo como se fosse morrer, mesmo ela estando na capa do DVD da próxima temporada.
      A diferença é que Theo não está na capa do próximo livro. (risadas maléficas).
      Sobre o povo no barco, era mais um bando de mercenários, a diferença destes é que eles sabiam das matrizes, percebeu?
      Quer mais fortes emoções? Só tem isso de agora em diante.
      O próximo já está na sua caixa de mensagens, boa leitura.
      Bjos e obrigada!

  6. bom pelo que sei das duas esses dois bandidos ai não vão da pra meia missa….agora enquanto isso a Cristiane nos mata do coração tenho certeza!!!!

    1. Não quero aterrorizar você, mas os vilões mais improváveis podem surpreender. (Isso também se aplica aos próximos capítulos).
      Se eu não deixar todo mundo ansiosa não tem graça. rs
      Bjos!

  7. E os capítulos estão cada vez melhores e angustiantes no suspense vermos que o tempo da Sam esta acabando e a busca dela parece esta sendo em vão não parece que essa jornada épica delas esta caminhado para um final feliz infelizmente. Gostei também do momento de contemplação delas é tão raro um momento de paz para elas. Ansiosa pelo desfecho do conto bjs Cris

    1. Oie Te!
      Nessa quase reta final a ação só tende a crescer. E vai assim até a última linha, as coisas só ficam calmas na parte dois. Mas não necessariamente calmo é uma coisa boa… Fica calmo até demais. (Já prevejo vocês pedindo a correria de volta rs)
      Esse comecinho calmo foi uma respirada, para tomar fôlego 😉
      Bjos, e obrigada!

  8. Juro que essa teoria da Theo virar um borg tipo o Nemesis me surpreendeu, sua imaginação é muito boa! rs
    Mas a parte de perder a memória seria bem triste, seria tipo um Robocob lésbico.
    Sim, não só você percebeu, mas Sam também percebeu que está tratando Theo diferente, na verdade ela está notando uma diferença em suas atitudes, mas não está tendo tempo para analisar esse processo evolutivo por qual está passando. Quem sabe um dia ela tenha tempo de sobra para pensar na vida… rs
    Conheceremos o homem barbado provavelmente amanhã ou depois de amanhã.
    Bjos!

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