Quem leu Amigos de Aluguel talvez se recorde do momento em que Lina e Alice viajaram de férias para os EUA, lá na metade do capítulo 38. Elas foram visitar a prima de Lina: Anna.
Sim, Essa Anna da Lince e a Raposa que vocês estão pensando mesmo.
**********
Amigos da Lince
- Merda, o carregador do celular. – Falei, dando um tapa na testa.
- O que? – Lina perguntou distraída.
- Eu sabia que tinha esquecido algo… O carregador ficou no banheiro, eu esqueci.
- Alguém te empresta, ou compramos outro.
Fazia um frio absurdo, aguardávamos no setor de desembarque do aeroporto de Bridgeport por alguém que nos buscasse, era quarta-feira à noite e tínhamos nossas malas nos fazendo companhia naquele saguão gélido.
- São elas? Perguntei.
- Onde, no guichê? Alice, ali são dois homens.
- Ah tá. Estou sem meus óculos, e não sei como elas são.
- Desembarcamos mais cedo que o esperado, elas devem estar a caminho. – Lina disse, aquecendo as mãos uma na outra.
Se eu tivesse lembrado de levar luvas, emprestaria para Lina, mas ambas haviam esquecido deste item.
- Elas falam português?
Anna fala, Jenny muito pouco.
Melhor ficar no inglês com elas então, não é?
Ahan, senão Jenny vai ficar perdida. Mais do que já é. – Lina sorriu, a única coisa que me aquecia naquele momento era enxergar suas covinhas no rosto.
Peguei as mãos dela e tentava esquentar com as minhas, sem muito sucesso.
- Suas mãos também estão geladas. – Ela constatou.
Abri meu casaco pesado preto, e o outro casaco menos espesso que estava por baixo, e coloquei as mãos dela para dentro.
- O que está fazendo? – Lina perguntou meio assustada.
- Vem cá, coloque suas mãos nas minhas costas, por baixo dos casacos, tenho certeza que esquentarão, minhas costas são quentes. – Ordenei.
Ela correu as mãos para minhas costas, eu me retrai espontaneamente pelo choque térmico daquelas mão geladas, mas começou a funcionar, e assim pertinho ela me aquecia um pouco também.
- Funciona. – Ela falou, perto do meu ouvido.
- Que cena bonitinha! Melhor voltarmos depois. – Era Jennifer se aproximando de nós, finalmente haviam chegado.
- Não, pelo amor de Deus, aqui tá um freezer, nos tire daqui. – Falei desesperada, em seguida abracei e cumprimentei ambas.
- Ela chegou a fazer um cartaz de boas-vindas, queria fazer faixas, mas não havia necessidade disso. – Anna falou, se explicando.
- Eu troco todas as faixas do mundo por um lugar aquecido. – Lina respondeu.
- Vamos, o carro está aqui em frente, minha casa é quentinha, se não for o suficiente, faço uma fogueira no meio da sala. – Anna disse, já nos ajudando com a mala a caminho da porta de saída.
- Nós já fizemos algo parecido. – Jennifer completou.
- Uma fogueira no meio da sala? – Perguntei, meio assustada.
- Numa lareira desativada, mas foi numa casa abandonada, no dia que nos conhecemos.
Eu a olhei arregalada.
- É uma longa história. – Jennifer finalizou, gesticulando com a mão.
Lina havia me falado um pouco sobre elas, que se conheceram de uma forma inusitada, há um ano e alguns meses, namoravam há um ano, e que haviam passado por um período turbulento, ela não entrou em detalhes, mas eu sabia que haviam ficado um mês separadas. Eu havia acabado de conhecê-las, mas não conseguia imaginar aquelas duas separadas, pareciam feitas uma para a outra.
Jennifer dirigia o grande carro negro, adentramos uma pequena estrada de chão até a imponente e sombria casa de Anna, onde moravam também sua mãe e sua irmã caçula. Parecia uma mansão escura e envelhecida com o tempo, estacionamos no pátio em frente, coberto pela nevasca.
- Eu tinha quartos melhores para oferecer antes, mas agora que minha mãe e Angie estão morando aqui, se apoderaram dos maiores. – Anna se desculpava, nos mostrando o que seria nosso quarto por três semanas. Era um bom quarto, pelo menos a cama era enorme.
- Esse é tão grande quanto o meu. – Angie, a irmãzinha de Anna, que apesar de ter apenas quinze anos tinha quase o dobro da minha altura, veio nos cumprimentar também.
- Vocês duas realmente se parecem. – Lina constatou o que eu também havia percebido logo de cara, as irmãs eram parecidíssimas.
- Só na aparência, Anna é quietinha, eu não. – Angie explicava.
Fomos jogando nossas coisas pelo quarto, Lina adorava uma bagunça, e eu estava entrando nesta onda.
- Fizemos um jantar para vocês, nada elaborado, mas assim que tiverem vontade, venham jantar, ok? E fiquem a vontade, a casa é de vocês, se precisarem de algo, me peçam, até porque Jennifer nunca acha nada aqui nessa casa… – Anna disse, se despedindo na porta.
- Não acho porque você esconde as coisas! – Jennifer deu um falso murro no ombro de Anna, já saindo e fechando a porta.
Acompanhamos a porta se fechando, nos entreolhamos e soltamos uma gargalhada. Percebi que seria divertido conviver com estas duas.
- Se você me bater assim, saiba que eu bato de volta. – Lina disse, tirando o casaco pesado, jogando sobre uma poltrona marrom, tirei o meu também.
- E eu te denuncio. – Rebati.
- Você acha que acreditarão em mim ou numa pessoa fichada na polícia? – Lina disse.
- Golpe baixo. E saiba que eu consegui retirar a queixa. – A derrubei na cama, me jogando sobre ela.
- Sério? – Ela disse com os pulsos presos por minhas mãos.
- Quer dizer, meu pai conseguiu.
- Que pena, estava gostando dessa coisa de namorar uma fora da lei. – Eu continuava sobre ela na cama, o cansaço não tirava minha vontade de agarrá-la.
- Quem disse que namoramos? – Argumentei.
- Eu namoro quem então?
- Não sei. – Falei me fazendo de desentendida.
Ela me fitou mais um pouco e abriu um sorriso vagaroso.
- Eu sei onde você quer chegar.
- Não sei do que você está falando.
- Não vou cair nessa.
- Continuo não sabendo do que você está falando.
Ela apenas balançou a cabeça, ainda com um sorriso irônico.
- Agora saia de cima de mim, quero jantar.
Segurei mais firme seus pulsos.
- Me tire. – Desafiei.
Ela girou por cima de mim, agora eram meus pulsos que estavam em seu poder, e eu estava por baixo.
- Mudei de ideia, o jantar pode esperar. – Ela disse, sussurrando próximo ao meu ouvido, prosseguindo com alguns beijos por ali.
- Eu comi no avião.
- Eu também.
Quarenta minutos depois saímos do quarto, para jantar de verdade.
***
- O que querem fazer amanhã? – Jennifer perguntou, à mesa. Além do casal, Angie e Marianne, a mãe séria e elegante de Anna, completavam a ceia.
- Ãhn… Nada específico, talvez conhecer um pouco da cidade. – Respondi.
- Feito, vou ser a guia de vocês! Mas não se animem, a cidade não tem pontos turísticos, a estátua da liberdade fica a cem quilômetros daqui.
- Estamos de férias, só queremos relaxar. – Lina disse.
- Não sei o que é isso, mas eu quero. – Falei pedindo uma travessa de algo amarelo que estava na mesa.
- Tome. – Marianne me passou aquela pasta estranha, e resolveu entrar no assunto. Já havíamos entornado algumas taças de vinho.
- Obrigada, parece purê de algo radioativo. – Falei.
- Batata doce. – Ela respondeu.
- Ah, então deve ser bom. – Eu disse depois de pegar quatro colheradas.
- É bom sim. Então… Você é amiga da minha sobrinha há muito tempo?
- De quem?
- Lina.
- Ah, sim, quer dizer… – Olhei para Anna e Jennifer, como se perguntando se elas não haviam contado sobre nós para Marianne.
- Namorada, mãe. – Anna se antecipou.
- Hum, pelo visto isso é algo comum na família do seu pai. – Marianne respondeu à Anna.
- Espero que sim. – Anna respondeu com um sorrisinho.
Percebi que Marianne era uma mãe passando pelo período de aceitação. Nunca é fácil, e pelo visto Jennifer se divertia com isso, ao seu modo.
- Não tem gays na sua família, Marianne? – Jennifer perguntou.
- Não que eu saiba.
- Com certeza tem.
Eu via Anna ficando corada com a conversa, correndo o olhar de sua mãe para Jennifer.
- Acredito que não, e se tem, são discretos.
- Acho que seu irmão era gay.
- Victor?
- Sim, um cara amargurado que nunca saiu do armário por medo do pai tirano.
- Você não conheceu Victor.
- Infelizmente sim, aquele ódio todo me cheirou à uma vida reprimida.
Eu não fazia ideia do que se tratava essa conversa, mas parecia algo delicado.
- Bom, agora não há o que argumentar sobre a vida pregressa dele, Victor já não está mais entre nós. – Marianne disse, com leve incômodo.
- Vejamos pelo lado bom, você e Angie estão conosco agora. – Anna disse.
- É, olha como nossa vida é melhor agora, mãe. – Angie falou.
- Sem dúvida, ninguém mais do que eu está feliz por estar aqui com vocês. – Marianne parecia baixar a guarda.
- Eu sei que você já me ama, sogrinha. – Jennifer não perdeu a chance de cutucar.
– Eu adoro você, cunhada. – Angie respondeu.
- Sobremesa? – Anna interrompeu, levantando-se.
***
No final da noite restava apenas nós quatro na grande sala, em frente à lareira. Jennifer deitada no sofá com a cabeça no colo de Anna, era a mais animada.
– Querem saber a história da lareira na casa abandonada? – Ela falou sorridente.
– Desde o aeroporto que estou conjecturando sobre essa história. Foi algum ritual satânico? – Respondi.
– Talvez do acasalamento. – Jennifer disse e caiu na gargalhada.
– Não acreditem em tudo que essa garota fala. – Anna comentou.
– Ok, pessoa séria e honesta, conte a história, eu gosto de ouvir a sua versão.
– A versão resumida ou a romanceada?
– Você não sabe contar a versão romanceada.
– Vou contar a versão rápida então.
Anna limpou a garganta antes de iniciar.
– Era uma vez uma garota inconsequente e teimosa, meio metida a valente, que juntou-se com mais um punhado de pessoas igualmente inconsequentes e nada inteligentes, e invadiram minha casa.
– Não estou gostando deste começo. – Jennifer a interrompeu.
– Quer contar?
– Não, não, continue. – Jennifer bocejou e ajeitou-se sobre as pernas de Anna.
Eu e Lina acompanhávamos atentamente, cada uma em sua poltrona, eu ainda com meu pote de sobremesa.
– Com esse jeito persuasivo que vocês estão conhecendo, ela me convenceu a acompanhá-los numa viagem de trem até uma terra desconhecida, onde tivemos que passar a noite numa casa abandonada.
– Você esqueceu de dizer que eu estava com o ombro infeccionado.
– Ah sim, mesmo com um ferimento sério no ombro, e ardendo em febre, Jennifer continuava jogando gravetos e mexendo na lenha na lareira que havia naquela casa.
– Alguém tem que fazer o trabalho pesado.
– Até que ela caiu.
– Caiu como? – Lina perguntou assustada.
– De febre, mal conseguia se manter acordada.
– Eu perdi bastante sangue. – Jennifer cochichou de lado.
– Eu cuidei do ferimento dela, e dormimos no chão daquela sala, como estava frio eu a mantive abraçada a mim, para aquecê-la.
– Ela tirou casquinha de mim enquanto eu dormia.
– Que mentira, eu só te tratei bem, você estava com frio.
– Ok, é mentira, ela só cuidou maravilhosamente de mim. Foi nessa noite que me apaixonei por ela. – Jenny contava.
Percebi Anna com um sorrisinho satisfeito.
– É… Eu também. – Anna falou timidamente, depois curvou-se para dar um beijo no rosto de Jennifer.
– E essa não é a versão romanceada, imaginem só se fosse. – Lina disse.
– Mas não achem que começamos a namorar logo em seguida. – Jennifer retomava. – Anna fez jogo duro comigo por meses, sabem quando saiu o primeiro beijo? Quase quatro meses depois, isso porque eu tomei a iniciativa.
– Eu não queria ser mais uma de suas tantas amizades coloridas.
– Eram só duas.
– Que fiquei sabendo, sim. E aquela francesinha metida era bem mais que amizade colorida.
– Claro que não, eu não tive nada sério com ela.
– Não foi o que ela me disse no telefone. – Anna falava, enquanto mexia carinhosamente nos cabelos quase loiros de Jennifer. – E você a beijou quando ela veio te visitar depois.
– Nós estávamos separadas.
– Você beijou meio mundo naqueles dias que ficamos separadas.
– Meninas, ela não fica linda assim vermelha de ciúmes? – Jennifer disse para nós.
Nós duas nos entreolhamos, rindo.
– Anna, então você é a ciumenta do casal? – Perguntei.
– Não sou ciumenta.
– Ela nunca admite, mas vamos mudar de assunto: como vocês se conheceram?
– Numa cafeteria. – Respondi, com a cabeça apoiada na mão, morrendo de sono.
– É, essa é uma forma bem, bem, bem reduzida da história. – Lina completou.
– Elas estão com sono, Jennifer, vamos liberá-las. – Anna falou, já se levantando do sofá.
– É a mini versão, depois a gente conta a versão estendida, pode ser? Eu estou quase capotando aqui. – Falei.
– Claro, você tem três semanas para contar. – Jennifer disse, nos despedimos e seguimos para o quarto com papel de parede de tulipas e grandes janelas brancas.
***
- Qual o lance, da mãe da Anna? – Perguntei para Lina, quando nos preparávamos para dormir, vestindo meus pijamas.
- Como assim?
- Ela não morava aqui?
- Não, ela e Angie moravam na Tailândia.
- Por que tão longe?
Lina, que já estava deitada na cama, lançou um suspiro.
- Longa história. Venha dormir, formiguinha.
Levantei as cobertas e me enfiei próxima à Lina, a abraçando.
- Por que formiga?
- Você repetiu três vezes a sobremesa.
- Você contou?
- Foi inevitável.
- Eu gosto de pudim de leite.
- É, percebi. Desligue o abajur e volte a ficar em cima de mim, o quarto ainda está frio.
Desliguei o abajur e voltei a deitar em seu peito.
- Você tem sorte, minha mãe gosta de você. – Falei, me aconchegando, recebendo beijos na testa.
- Dona Clara me ama. Impossível não gostar de mim. – Ela disse com um sorriso convencido.
- Tenho que concordar com esta afirmação. Ao mesmo tempo em que isso é algo preocupante.
- Preocupante?
- Você tem ideia do número de pretendentes que terei que eliminar? Todo mundo se apaixona por você. – Eu disse.
- Quanto mais amor, melhor. – Ela disse com um tom cínico. – Ai! Seus pés estão frios!
- Ops…
- Tá bom, pode colocar seus pés nos meus, eu te esquento.
Me aconcheguei mais um pouco nela, eu recebia um carinho lento, o sono veio com força total.
Após alguns segundos de silêncio, ela perguntou:
- Há quanto tempo nos conhecemos?
– Hum… Cinco meses?
– Desde quando você gosta de mim?
– Sempre gostei de você.
Eu não a via, mas percebi um tom de voz inseguro.
– Sim, mas quando… de fato você… quando você se apaixonou?
– Quanta pretensão achar que sou apaixonada por você, eu apenas gosto de você. – Falei segurando o riso. Eu gostava de provocar esse lado inseguro dela. Ok, me julguem.
– Mas você disse uma vez que…
Já posso morder?
– Não me recordo.
- Mesmo?
– Mesmo.
Silêncio desconfortável.
- Não seja boba, você sabe que sou completamente apaixonada por você, tenho os cinco pneus arriados por sua pessoa. – Falei num tom de voz carinhoso.
Mais silêncio.
- Desde quando?
- Hum… Acho que desde o momento em que você me trouxe aquele café com leite de coco e mel.
- Sempre funciona. Já conquistei uns três assim. – Ela me dava o troco.
- Eu dei um tapa de mentirinha no ombro dela.
- Ai! Bem melhor que colocar anúncio no Facebook recrutando amigos. – Ela falou ‘amigos’ com aquele tom debochado.
– E tem gente que responde, não é?
– Eu não respondi nada, foi o Renan.
– Você teria respondido se tivesse visto meu anúncio irresistível.
– Teria sim, para te oferecer um livro de autoajuda.
– Tipo ‘how to make friends – for dummies’?
– Tipo isso. Eu teria achado que você era daquelas pessoas carentes que moram sozinha com dezoito cachorros e onze gatos, potencialmente suicidas, e que conversam com o espelho segurando uma escova de dentes como microfone.
– Eu tive centenas de respostas. Te falei que uma mulher linda queria um ménage comigo?
– Falou sim, porque não selecionou ela?
– Eu não queria me envolver com uma mulher que estivesse também envolvida com um homem, tenho horror à triângulos amorosos.
– Super engraçado, Alice.
– Ok, agora é boa noite mesmo, não gosto do meu sarcasmo sonolento. – Falei.
– É ácido.
– Eu sei.
– Boa noite.
Eu subi um pouquinho e dei um beijo nela.
Dois minutos de silêncio depois:
– É verdade que você conquistou outras pessoas com aquele café estranho? – Perguntei.
Ela apenas cobriu minha boca, e dormimos.
***
Uma semana se passou e já havíamos feito todos os passeios possíveis naquela região, fazia frio na maior parte do tempo e o porto era uma região feia, na semana seguinte passaríamos alguns dias em Nova Iorque.
Naquela sexta-feira o tempo estava mais agradável, nós quatro estávamos voltando de uma caminhada pela praia, no final da tarde.
Anna e Lina seguiam papeando na nossa frente, eu e Jenny conversávamos com intimidade.
– Elas são próximas, não são? – Perguntei para Jennifer.
– Anna diz que Lina é a prima preferida dela, e apesar de morarem tão longe, elas sempre estão se falando.
– Lina não é de falar muito sobre sua vida pessoal.
– Nem Anna, ela foi se abrindo para mim aos poucos.
– Mas você parece ser melhor nisso, em deixá-la à vontade. Na verdade acho que eu não colaboro muito, não facilito… em certas coisas sou mais… digamos… mais travada, sabe? – Falei, em tom confessional.
– Com o que? – Jennifer disse antes de derrubar seu iPod no chão.
– Tome. – A entreguei. – Eu gostaria de conseguir falar o que sinto com mais facilidade, ser mais compreensiva, conquistar sua confiança. Eu nem consigo chamá-la de algo que não seja seu nome.
– Já tentou chamá-la de ‘meu pequeno doce de abóbora’? Ou ‘meu pudim de leite’? – Ela riu.
Eu também ri, e respondi.
– Vai demorar um pouco para atingir esse nível de… Cafonice? – Ri mais.
– Ok, falando sério agora. – Jennifer começava. – Não se force a falar nada que você não se sinta à vontade. Aquela ali também tinha um sério bloqueio com coisas meigas e assuntos pessoais, acabou saindo naturalmente, aos poucos, entende? No dia que ela me chamou de ‘pequena’ eu quase tive uma síncope.
– Entendi… é que… às vezes a situação pede algo mais, mais do que simplesmente o nome. No caso dela, uma redução do nome, mas enfim, eu já tentei e não saiu. Eu queria ter mais intimidade.
– Com o tempo a intimidade vai aumentando, claro que não traz apenas coisas boas, acredite, muita intimidade pode ser uma merda, as pessoas param de fechar a porta do banheiro. Mas as palavras saem com mais naturalidade com o tempo, com a convivência. Você vai ver, logo você estará a chamando de flor do dia.
– Não exagere, Jenny. – Fechei meu moletom quando um ventinho soprou do mar.
– Sabia que Anna não consegue me chamar de Jenny?
– Por quê?
– Hum… acho que não criou o hábito, mas de certa forma eu acho isso até fofo, eu gosto dela me chamando pelo nome inteiro. Exceto quando está brava.
– Jennifer? – Anna virou-se para trás, a chamando.
Jenny deu uma risadinha para mim antes de responder.
– Não, ainda não tropecei em nenhuma concha assassina. – Ela respondeu.
A dupla da frente seguiu para o paredão de pedras que existia em frente à casa, e sentaram-se sobre ele, nós duas continuávamos conversando, próximo ao mar.
– Hey baixinhas, venham para cá! – Lina bradou lá de cima, gesticulando.
Fomos até elas, e eu não deixaria isso barato.
– Não somos baixinhas, temos estatura mediana, vocês que são essas… essas mulheres altas demais.
Me aproximei dela de frente, ficando de pé entre seus joelhos.
– Veja pelo lado bom, você é minha baixinha preferida. – Lina disse enquanto traspassava seus braços em mim, me puxando para perto dela. Cedi, a abraçando também.
Jennifer recostou-se no paredão, recebendo os braços de Anna ao redor, cruzando à sua frente.
– Alice, pelo menos nunca teremos problemas em pegar produtos no alto da prateleira. – Jennifer disse.
– Nem em trocar lâmpadas. – Respondi.
– Amor, por falar nisso, estou com duas lâmpadas queimadas lá em casa, você pode trocar quando for lá? – Jennifer falou para Anna.
– Você nunca fala nada quando estou lá.
– Espera aí. – Interrompi. – Você não mora aqui? – Falei com espanto.
– Nops.
– Ela tem o apartamento dela, está apenas me visitando, ela nunca aceita meu pedido para vir morar aqui comigo. – Anna disse.
– Podemos fazer uma festinha lá neste final de semana, a propósito. – Jennifer disse.
– Mas desta vez sem banda, senão a síndica vai te expulsar pra valer.
– Banda? – Lina perguntou assustada.
– Uma amiga nossa levou a banda para ensaiar lá, não deu muito certo, a síndica estava num dia ruim. – Jennifer explicava.
– Eu entendo. – Falei, rindo. – Um amigo nosso construiu um estúdio na casa dele, justamente para evitar esse tipo de coisa.
– Sério? Um estúdio, estúdio mesmo?
– Sim, eu o ajudei a equipar. – Falei e percebi que Lina havia fechado a cara.
– Até escolheu o sofá, e o batizou. – Lina resmungou, irônica.
Eu a fitei, rindo.
– Eu sei que você adora aquele sofá. – Passei minhas mãos ao redor do seu pescoço e a puxei para um beijo rápido.
– Ok, já entendi que esse sofá tem história. – Jennifer disse.
– Vamos entrar? O sol já se foi e esfriou. – Anna falou.
***
Naquela manhã de sexta-feira, Lina havia recebido uma ligação de Renan dizendo que seu pai havia sido internado, um mal súbito o levara ao hospital para fazer exames, mas seu quadro era bom.
– Tome, leve essa caneca de café para Lina. E esta é a sua. – Eu havia acabado de entrar na cozinha, Anna me entregou duas canecas fumegantes.
– Não sei onde ela está.
– No cantinho da reflexão. – Jennifer respondeu, sentada a mesa, debruçada numa cesta de torradas.
– Onde fica isso?
– Aquele píer aí em frente. – Anna disse.
– É um lugar com alto valor sentimental, então faça jus a ele e vá lá dar um colo para sua namorada. – Jennifer disse, de boca cheia.
Eu obedeci e fui até o final do píer naquela manhã nem tão fria do primeiro dia de fevereiro. Lina repousava as mãos ao seu lado, na madeira, com um olhar perdido, o cabelo preso e um casaco de lã azul marinho que eu adorava quando ela usava.
Ela deu uma olhadela para trás quando percebeu minha aproximação, então sentei ao seu lado, lhe entregando a caneca.
– Tome, é o café que você manda para cá.
– É nosso café normal, sabia? Não é nenhum café gourmet nem nada, mas o pessoal aqui gosta de café brasileiro.
– E também tem o mérito de sua prima, que sabe como preparar. – Respondi.
– É o toque especial. Obrigada pelo café. – Ela disse tomando minha mão e a beijando.
– Como está seu pai?
Lina balançou a cabeça, com desânimo.
– Melhorando, vai precisar fazer uma dieta restrita.
– Ele deve adorar dietas restritas… – Falei.
– Meu pai é tão formiga quanto você.
Passei meu braço sobre seus ombros, dando um beijo demorado em seu rosto.
– Essas coisas acontecem, ele vai ficar bem.
– Vai sim.
Naquele dia não saímos, enquanto Anna trabalhava na forja, eu, Lina e Angie assistimos filmes durante a tarde. E foi uma boa tarde.
***
Três dias depois acordei sozinha numa manhã fria, não encontrei Lina ao meu lado na cama, mas não dei maior atenção a isso no momento, talvez ela estivesse já tomando seu café. Ok, eram quase dez da manhã, alguém me largou na cama, vamos encarar os fatos.
Após acordar de verdade, usar o banheiro e me aprontar, adentrei a sala enorme e encontrei Anna descendo as escadas com uma faca nas mãos. Tomei um susto inicial mas lembrei que ela fazia essas facas.
– Vai matar alguém hoje? – Perguntei.
– Bom dia, Alice. – Ela me respondeu, sorrindo.
– Bom dia, desculpe, me impressionei com a faca.
– É uma adaga chamada stilleto, encomenda especial. Veja, tome. – Anna estava com um casaco negro que ia até os joelhos.
Peguei a adaga estreita nas mãos, reluzia de qualquer ângulo, era uma bela arma branca. Mas ficava melhor nas mãos hábeis dela.
– É linda, e perigosa. Tome, melhor não dar sorte ao azar. Cadê o povo dessa casa? – Falei olhando ao redor.
– Lina, Jennifer, e Angie foram ao Centro, fazer compras.
– E me abandonaram aqui?
– Lina me disse que você estava dormindo e não quis te acordar, disse para você usar o dia para reescrever seu livro. A propósito, eu quero ler este livro.
– Enviarei uma cópia para você. Duas cópias. – Falei ainda assimilando a informação.
– Vem. – Anna disse, já indo para a cozinha.
– Para onde?
– Venha tomar café comigo.
Eu gostava da cozinha daquela casa, era o cômodo mais aconchegante e claro. Haviam bancadas rústicas de tijolos brancos, e utensílios pendurados no armário, como na casa dos meus pais. E eu gostava dessa coisa de tomar café na mesa da cozinha, nunca gostei de fazer as refeições em uma sala de jantar, acho inóspito.
– Você não ficou chateada por elas terem saído sem você, ficou? – Anna perguntou sentando a minha frente, na mesa também branca.
– Não, eu realmente preciso escrever, e não sou fã de bater perna fazendo compras.
– Tome, o açúcar. Mas é para colocar no café. – Anna brincou. Aos poucos eu enxergava a pessoa doce que havia por baixo daquela mulher séria e imponente, e entendia como alguém tão leve e alegre como Jennifer poderia ter se apaixonado por ela.
– Eu ia perguntar se ainda tem pudim, mas mudei de ideia.
Anna riu, e tirou uma redoma que cobria o pudim, no final da mesa.
– Tem sim, fique à vontade. – Ela o deslizou para perto de mim.
Fazia meu desjejum as dez da manhã, saboreando avidamente o pudim, enquanto Anna tomava lentamente seu café.
– Não vai comer?
– Já tomei meu café da manhã, eu costumo acordar cedo.
– Eu também, meio-dia já estou de pé.
– Não sei como você consegue, as oito da manhã é como se tivessem percevejos na cama, preciso levantar. Jennifer reclama que sempre acorda sozinha, mas meu horário é normal, ela que é preguiçosa.
– Eu sou do time dos preguiçosos. – Brinquei.
– Desculpe, não quis te chamar de preguiçosa, cada um tem seus melhores horários. – Anna respondeu encabulada.
– Eu sei, relaxa. – Resolvi mudar de assunto. – Você disse que já convidou Jenny para morar com você várias vezes, ela tem algum motivo específico para a recusa? Se eu estiver sendo inconveniente pode falar.
– Não, nada especial, ela gosta de ter seu próprio canto, aquela baguncinha tem a cara dela. Eu a respeito, não insisto, quando ela quiser vir, sabe que as portas estarão abertas. Essa casa já é dela também.
Mexi meu café, pensativa, hesitando para entrar num determinado assunto.
– Vocês terminaram uma vez, não foi? – Perguntei.
– Terminamos. – Anna respondeu num tom sério, porém tranquilo.
– É difícil imaginar vocês separadas.
Anna deu um último gole em sua caneca, balançou a cabeça antes de voltar a falar.
– Confiança. Tivemos um problema de confiança, e falha de comunicação.
– É, eu entendo disso…
– Alice, eu conheço Lina desde que ela era criança, eu sei que minha prima tem dificuldades em se expressar, ela odeia ter que dar satisfações, e isso é perigoso num relacionamento. Então você precisará ter paciência com ela, não deixe para perguntar suas dúvidas depois, talvez ela omita algumas coisas num primeiro momento, mas não é por falta de confiança, ela é insegura. Eu sei que sou suspeita para falar, porque sou parente e gosto um bocado dela, mas Lina é boa pessoa, ela não gosta de mentir nem enganar ninguém.
Não estava preparada para essa virada de jogo na conversa.
– Foram cinco meses batendo cabeça, eu só quero ficar em paz com ela, estou a compreendendo melhor agora, e exercitando meu lado paciente. Mas já percebi que Lina é uma mulher incrível.
– Ela também te acha incrível, ela tem falado tanto de você nesses últimos cinco meses. – Anna se espojou na cadeira, para trás. – Vocês foram num show, não foram?
– Sim, fomos. – Eu respondi com um sorriso besta.
– Vocês tiraram uma foto nesse show, e essa foto era o plano de fundo do seu celular. – Anna riu.
– Jura? – Eu não sabia disso.
– Foi uma noite importante para ela.
– Você e Jennifer já foram em algum show?
– Não, nunca, eu não gosto muito de multidões.
– E danceterias?
– Costumamos ir a um pub.
– Gay?
– Não.
– Poderíamos ir a algo gay, o que acha?
– Eu nunca fui, mas eu topo.
– Nunca?
– Os pubs costumam ser bem amigáveis, para mim é o suficiente.
– Vamos a algo gay no sábado então.
– Ãhn… Ok, Jennifer deve conhecer algo, ela conhece todos os inferninhos dessa cidade.
– Fechado.
– Vai escrever hoje?
– Vou, assim que terminar este maravilhoso café.
– É só café brasileiro. – Anna respondeu encabulada.
– Seu preparo tem algum segredo, mas não vou pressioná-la a revelar.
Anna riu.
– Quer escrever lá em cima?
– Onde?
– Na sacada do meu quarto, tem uma boa vista.
Quinze minutos depois, subi para a suíte master do casal, com outra caneca de café e meu notebook.
Sentei no sofá da varanda, a minha frente uma vidraça panorâmica e um mar esverdeado com espuma branca, me dando toda a inspiração que precisava.
Estava decidida a mudar radicalmente minha história, As três margens do Rio Charles terminaria com duas margens diferentes. Alexandra e Kate ficariam juntas e felizes. Espera aí, não posso simplesmente fazer essas duas cabeçudas ficarem juntas, desse jeito o namoro delas vai durar menos que um casamento Kardashian.
Elas precisam evoluir. Ok, vamos evoluir espiritualmente estas duas. Como? Hum. Elas irão numa viagem de estudos para Marrocos.
Três horas e cinquenta minutos depois, minha escrita compenetrada foi interrompida pelo abrir da porta do quarto, Jennifer adentrou o quarto de forma estabanada e falante. Tirou o casaco e a camisa, jogando sobre a cama, ficando apenas de sutiã.
– Amor, levamos duas horas para encontrar, Lina estava quase desistindo. – Jennifer disse, achando que eu era Anna, atirando o sutiã na cômoda.
Num primeiro momento fiquei sem palavras, tentando não olhar para Jennifer seminua andando pelo quarto, depois me manifestei.
– Jenny? Sou eu. – Dei um tchauzinho tímido da sacada.
– Ahhhh! – Jennifer correu até o sofá e se cobriu com uma almofada verde.
– Desculpe, Anna disse que eu poderia escrever aqui. – Falei, sem jeito.
– Porra, Alice! Que susto!
– E-e-eu já vou sair.
– Relaxa, fica aí, mas vira para o mar.
Me virei na direção do mar, salvei meu arquivo, e coloquei o notebook ao lado.
– Pronto, pode virar. – Ela havia vestido uma camiseta.
– Da próxima vez prometo pendurar uma placa da porta. – Falei, saindo da sacada com meu notebook debaixo do braço, e um sorriso sem graça.
– Da próxima vez vou tirar a roupa ao som de alguma música. – Jennifer falou rindo. – Desencana, você está cansada de ver mulheres nuas.
– Não sei o que andaram falando sobre minha pessoa, mas isso é mentira.
– Você não estava tendo um caso com três pessoas ao mesmo tempo? Foi o que captei das conversas.
– Não é bem assim. – Respondi provavelmente já corada.
Jennifer riu de novo.
– Não estou te julgando, pelo contrário, já ia até pedir autógrafo. – Jennifer sentou no final da cama.
– Ainda bem que Anna não tem vizinhos.
– Só o mar.
Minha curiosidade havia sido despertada com a rápida visão das costas nuas de Jennifer, haviam algumas cicatrizes leves, por toda extensão, como pequenas e longas suturas.
– Jenny, desculpe a curiosidade, mas o que aconteceu com as suas costas? Foi alguma queimadura?
Jennifer desfez o sorriso aos poucos.
– Não, foi um infeliz acidente, são cortes.
– Ah.
– Você quer mesmo saber o que foi?
– Apenas se você se sentir à vontade com esse assunto.
– Tudo bem, não tenho problemas. É que eu resolvi lutar com o Wolverine. Foi uma péssima ideia. – Jennifer voltou a sorrir.
E percebi que não foi boa ideia entrar nesse assunto, Jenny não costumava se esquivar de nada.
– Ninguém é páreo para garras de adamantium. – Brinquei.
– Aprendi isso na carne.
– Bom, vou deixar você sozinha para terminar seu strip tease. – Me dirigi a porta.
– Eu trouxe uma caixa de donuts, vá lá comer alguns, antes que Angie coma todos.
Desci e encontrei Angie debruçada sobre a mesa da cozinha, devorando um donut e com açúcar nos cantos da boca.
– Jenny disse que eu precisava correr antes que os donuts acabassem. – Falei já indo na direção da caixa.
– Ela come mais que eu.
– Posso pegar um?
– Claro, pegue quantos quiser.
– Dois?
– Ok, dois.
Peguei os dois quitutes e fui para nosso quarto, já devorando o meu. Daria o outro para Lina.
Abri a porta e Lina estava abaixada, mexendo em algumas sacolas mais ao canto.
– Olá fugitiva. – A cumprimentei, quase a matando de susto. Ela pulou, levando a mão ao coração.
– Que susto, Alice!
– Trouxe um donut para você. – Me aproximei dela. – Posso ver as compras?
– Não, pare aí!
Interrompi o passo, parei em frente a cama.
– Ok. Vai querer? – Falei erguendo a rosquinha com cobertura de chocolate.
– Quero.
Ela veio até mim, e tomou a rosquinha. Deu uma mordida, depois um beijo, de boca cheia. Foi um beijo rápido.
– Comprei luvas para nós. – Ela disse, traspassando a mão em minha cintura.
– Que bom, poderemos devolver as luvas para Anna.
– Uhum. Escreveu?
– Escrevi. Quer dizer, reescrevi.
– Como foi? – Ela me largou e sentou na cama, ainda comendo.
– Eu odeio reescrever, mas me senti aliviada alterando essa história. Estou mudando o curso do Rio Charles. – Sentei ao seu lado, comendo o último pedaço.
– Quer conhecer o Rio Charles?
– O de verdade?
– É, Boston nem é tão longe assim daqui.
– Isso alteraria nosso cronograma.
– Cronogramas não são imutáveis, podemos ficar menos dias em Nova Iorque.
– Pensarei no assunto. – Vocês acham que esqueci das compras misteriosas? – O que tem nas sacolas? Brinquedos sexuais?
Lina tomou calmamente meu pulso esquerdo, depois também tomou meu pulso direito, e me deitou na cama, ficando por cima de mim.
– Não é da sua conta. – Ela me disse concisamente, e depois beijou meu pescoço. – São apenas lembrancinhas para os conhecidos.
Sacolas deixadas de lado temporariamente.
Depois de uns vinte minutos bagunçando a cama, ela deitou em cima de mim.
– Foi cansativo hoje, vou tomar um banho e comer algo de verdade. – Ela disse após um suspiro, com a cabeça em meu peito.
– O que você levou duas horas procurando?
Ela parou o afago que fazia em meu braço.
– Quem disse que fiquei duas horas procurando algo? – Percebi um leve nervosismo em seu tom de voz.
– Jennifer disse, mas foi sem querer, ela achou que eu era Anna.
– Eu não sei do que ela está falando, apenas compramos tranqueiras. – Definitivamente o tom de voz dela estava diferente. Ela estava escondendo algo.
– Alguma lembrancinha em especial?
– Alice, você não sabe a hora de parar. – Lina saiu de cima de mim, deitando de costas ao meu lado.
– Ok, assunto encerrado. – Se vocês acham que irei remexer naquelas sacolas enquanto ela estiver no banho, saibam que estão completamente equivocados, e estou decepcionada por pensarem que eu cometeria tamanha falta de respeito.
– Jennifer entrou no quarto e pensou que você era Anna na sacada? – Ela voltou a falar, segundos depois.
– Uhum.
Silêncio.
– O que aconteceu com as costas dela? Eu vi várias cicatrizes. – Falei.
– Como você viu as costas dela?
– Ela foi tirando a roupa, achando que eu era Anna. Mas a alertei antes de tirar tudo.
– Foi um acidente, mas elas não gostam de falar sobre isso, Anna se sente culpada. Não toque nesse assunto com elas.
– Eu percebi, ela mudou de assunto.
– Você perguntou para ela? – Lina sentou-se na cama, me fitando num misto de surpresa e bronca.
– Perguntei, eu não sabia que não podia falar sobre isso.
– Não é que não pode falar, mas foi indelicado da sua parte.
– Você sabe o que aconteceu? – Subi um pouco na cama, deitando a cabeça nos travesseiros.
– Sim, eu sei, mas é um assunto íntimo, não acho boa ideia conversarmos sobre isso agora.
– Tudo bem.
Silêncio.
– São suturas? – Voltei ao assunto.
– Onde eu desligo você?
– É só curiosidade.
Lina me encarou e deu um suspiro impaciente.
– São suturas em sua maior parte, eram cicatrizes maiores e profundas, mas ela fez uma cirurgia plástica no Brasil. Lembra que eu falei que elas me visitaram ano passado?
– Ah, lembro. Então foi para isso.
– Foi.
– Ela tem uma tatuagem nas costelas, mas não identifiquei o que era, não deu tempo de ver.
– Tem, é um Bob Esponja zumbi.
– Sério? – Eu ri, sem acreditar.
– Sério. Foi para cobrir cicatrizes também.
– O que aconteceu com ela? Foi triturada numa máquina de feno?
Lina saiu da cama, indo até o armário.
– Você não deveria brincar com isso. Assunto encerrado por hoje, vou tomar banho.
No restante da tarde e da noite, Lina estava estranha, falava apenas o necessário comigo. Não parecia fria, mas talvez um tanto quieta e distante. Tentei iniciar algo na cama a noite, mas ela não quis fazer. Teorias brotavam em minha mente, a maioria pessimista.
Ela estaria mudando de ideia?
Acordei no dia seguinte novamente sozinha na cama, porém mais cedo, as nove. Nada de Lina no quarto, mas seu casaco azul não estava pendurado nos ganchos da parede, provavelmente ela havia saído de novo.
Um tempinho depois saí do quarto, estava cruzando a sala quando vi Anna descendo as escadas. Esfreguei meus olhos.
– Me diga que isso é um grande dejavu. – Falei.
– Não, é apenas uma repetição da sua manhã anterior. – Às vezes Anna não tinha senso de humor.
– Bom dia, desculpe a falta de educação.
– Bom dia, garota abandonada.
– As meninas foram fazer compras no Centro de novo?
– Não, Angie e Jennifer estão lá em cima estudando.
– E Lina?
– Está lá fora, no cantinho da reflexão.
– Hum, aconteceu algo?
– Eu ia te perguntar a mesma coisa. – Anna rebateu.
– Que eu saiba não.
– Lina está estranha, mal falou com a gente hoje cedo. – Anna sabia como me deixar preocupada.
– Será que foi algo com o pai dela?
– Não, ela disse que ele está bem, que teve alta. Vocês brigaram ontem?
– Não, não brigamos. Mas ela também estava estranha comigo. – Coçava minha nuca, confusa.
– Acho que aconteceu alguma coisa, ela nem quis tomar café.
– Eu vou lá falar com ela.
– Espere, vou fazer um café rapidinho, para vocês duas.
Fiquei sem jeito de recusar, apesar da minha curiosidade gritante.
– Ok. – Nos dirigimos para a cozinha, puxei uma cadeira, e assistia Anna fazendo o café com uma lentidão irritante.
Brincava de catapulta com a colher e o açucareiro, tentando acertar açúcar dentro da xícara, enquanto organizava meus pensamentos. Mirava de forma concentrada quando Anna começou a falar.
– Jennifer me disse que você a viu nua.
Arremessei açúcar com colher e tudo para o chão.
– Ãhn?
Anna virou a cabeça para trás, rindo.
– Ela me disse que pensou que eu estava na sacada e tirou a camisa. Você está tensa, Alice, relaxe.
Relaxar? Lina me contou uma vez que Anna havia ateado fogo no quarto da última mulher que colocou as mãos em Jennifer. Ela me contou rindo, mas no fundo eu acreditei pelo menos em parte.
– Estou tranquila. O café está pronto?
– Sim, tome. – Ela me entregou duas canecas fumegantes, e parti às pressas para o cantinho da reflexão.
Da cozinha até aquele píer no mar o trajeto deveria ter uns cem metros, consegui pensar em várias teorias enquanto caminhava até lá.
Por que ela não deixou que eu visse as lembrancinhas? Alguma delas era especial para alguém especial? Algo de fácil identificação, como por exemplo algo nerd para Paul? Eu não veria nenhum problema se ela tivesse comprado algo legal e caro para ele, eu dei um boneco do Homem de Ferro de 60 centímetros uma vez.
Dei bom dia assim que me aproximei, ela deu uma olhada rápida para o lado, retribuindo o bom dia sem muita animação. Sentei ao seu lado, e entreguei sua caneca. Dei uma olhada demorada e discreta, e ela ficava tão bonita com aquele casaco azul marinho.
– Tome, seu café. Acordou sem fome?
– Quando fico ansiosa não consigo comer nada.
– Por que está ansiosa? Algo com seu pai?
– Não, ele está bem, já está em casa.
– Está ansiosa para voltar para casa?
– Não, não é isso. – Ela bebeu o café antes de voltar a falar. – Eu fiz uma coisa ontem, e… Bom, acho que precisamos conversar.
O gole de café que eu havia acabado de tragar transformou-se num cubo de gelo gigante na minha garganta, foi difícil engolir.
Balancei minhas pernas soltas acima do mar, olhando para baixo. Resolvi me antecipar.
– Você mudou de ideia, não foi? – Perguntei, sentindo um frio extremo subindo pela espinha.
– Sobre o que?
– Nós.
– Sobre ter um relacionamento com você? – Ela parecia agora mais confusa que eu.
– É.
– Alice, eu sei que você adora criar teorias, e às vezes passa bem perto da verdade.
– Passei perto da verdade?
– Não, passou mais longe do que o cometa Halley.
– O que é o cometa Halley? – Eu não sou tão velha quanto ela, não sei dessas antiguidades.
– Largue seu café. – Ela disse e largou sua caneca ao lado, na madeira do píer.
– Ok.
Ela me fitou de forma séria, e parecia um tanto insegura.
– Não fuja. – Ela disse e colocou a mão dentro do seu casaco, tirou algo de dentro, me fitou ainda mais séria, e voltou a falar. – Alice, você quer namorar comigo?
Lina abriu a mão e haviam duas alianças prateadas com detalhes dourados ali. Arregalei os olhos, olhei as alianças um pouco mais de perto, depois voltei a olhar para ela.
– Uou! São de verdade?
– Não, vieram no chiclete. Claro que são de verdade.
Emudeci, e voltei a encarar as alianças de verdade.
– Alice?
– Oi?
– Você já tem uma resposta? Estou com medo que o vento as derrube no mar.
Alguns segundos confusos depois, abri um sorriso, e a respondi.
– A resposta não é óbvia?
– Nem um pouco, eu quero que você realmente responda.
– É claro que eu quero namorar com você, então é sim, a resposta é sim.
Ela também sorriu, me presenteou com alianças e as covinhas que tanto adoro. Me puxou pela nuca, me beijando, após colocar o anel em meu dedo.
– Posso colocar a sua? – Perguntei.
– Achei que teria que colocar sozinha. – Ela me entregou, e coloquei também em seu dedo. Foi minha vez de roubar um beijo, dessa vez demorado.
– Por que você estava estranha comigo?
– Eu não estava estranha, estava ansiosa. E boa parte foi encenação.
– Anna disse que você estava estranha com ela também.
– Isso fazia parte da armação, ela te falar isso.
– Havia uma armação? Um complô? – Perguntei surpresa.
– Sim.
– Anna sabia de tudo, então?
– Todas elas sabiam e me ajudaram.
– Todas?
– Alice, dê uma olhadinha para trás.
Me virei no píer e pude ver Anna, Jennifer, e Angie sentadas na sacada ao longe, todas acenaram ao perceber que eu as olhava. Acenei de volta.
– São cúmplices… – Resmunguei, rindo. – E estavam assistindo tudo de camarote.
– Ótimas cúmplices, que devem estar ansiosas para saber o resultado. Quer ir lá? – Lina convidou.
– Sim, mas espera… – Pousei minha mão em seu braço. – O que de fato significa isso? – Até eu me surpreendo com minha capacidade em complicar coisas simples.
– Como assim?
– O que muda com essas alianças? Eu devo mudar algo? – Perguntei ingenuamente.
– Deve, você não pode mais flertar com as menininhas, nem responder suas leitoras ousadas nas redes sociais, desative suas duas contas no Facebook, agora você é oficialmente minha namorada e não tem mais espaço para isso. – Ela respondeu séria.
Eu a olhei espantada.
– Ma-mas eu nem flerto…
Lina me interrompeu, rindo.
– Eu estava brincando, meu amor. – Ela disse com a mão em meu rosto.
– Ah…
– Não muda nada, mas estranhamente eu me sinto mais sua agora.
E eu sinto a cabeça girando.
– Estranhamente a cada dia eu amo mais você. – Respondi, abrindo um sorriso. E ela me beijou.
***
Era quarta-feira, completávamos duas semanas de viagem, resolvemos ir para Nova Iorque depois do almoço. Voltamos na sexta-feira à noite, era mais divertido estar na casa delas do que na big apple. No sábado à noite, nosso último final de semana, fomos numa espécie de bar danceteria, que segundo Jennifer, era predominantemente lésbico.
Não era predominantemente lésbico, era totalmente lésbico. Era uma casa grande, com uns cinco ambientes, e havia mesas de sinuca, além de uma DJ desanimada no ambiente ao lado. Fiquei sentada atrás de uma mesa, conversando e bebendo com Anna, enquanto Lina, Jennifer, e mais duas garotas desconhecidas jogavam sinuca. Apenas observávamos, lado a lado.
– Quem é aquela garota cheia de intimidade com Jennifer? – Perguntei à Anna.
– Uma amiga, sua xará.
– Alice também?
– Ahan. Ex de Jennifer.
– Sério? Ex namorada dela?
– Na verdade ex amiga colorida, elas ainda ficavam quando nos conhecemos.
– Amiga colorida.
– Uhum. A garota queria mais, acho que Jennifer não queria dar o próximo passo com ela. E então eu apareci e baguncei tudo.
– Acho que já vi esse filme.
– É, já viu sim.
– Então… Essa Alice não deve gostar muito de você, não é?
– Digamos que ela não seja minha fã, mas convivemos bem. No início eu tinha um pouco de ciúmes, mas agora acho legal ver Jennifer interagindo com as amizades do passado, quero que ela tenha uma vida independente. – Anna discursou.
– Isso é importante, ter vida própria.
– É sim, não somos donos de ninguém.
– Você não gosta de sinuca? – Perguntei.
– Mais ou menos, mas Jennifer sempre trapaceia, não tenho chances.
– Trapaceia como?
– Ela tem seus métodos. – Anna deu um sorrisinho. – E você, não joga?
– Eu sou muito ruim. Conhece a outra garota? – Apontei para a amiga que conversava com Lina.
Além da minha xará, que era uma bela garota de cabelos loiros, havia uma outra, uma morena alta, de volumosos seios. Ok, não é muito lisonjeiro me referir a garota citando apenas este atributo, mas é que isso saltava aos olhos. Ok, perdão pelo trocadilho também.
Jennifer estava fazendo dupla no jogo com Alice, a ex. Lina fazia par com a morena de seios fartos.
– Não conheço, mas deve ser amiga de Alice, a ex.
– Bonita, a garota. Será que são de verdade?
– O que?
– Os seios, será que são originais de fábrica? – Entornava de forma despojada meu caneco de chope.
– Pra falar a verdade não reparei muito nessa garota.
E eu sabia porque, Anna não tirava os olhos da interação entre Jennifer e Alice, a ex. E parecia que cada vez mais tinham intimidade. Todas as quatro.
Estavam jogando a segunda partida, e já estava no final, restavam umas três bolas na mesa apenas, e o jogo parecia disputado e empolgante. Para as quatro, não para nós duas.
Lina encaçapou uma bola, e a morena comemorou animadamente, a abraçando. Ela errou a tacada seguinte. Era a vez de Jennifer agora, Alice, a ex, aproximou-se por trás, a envolvendo e ajudando a segurar o taco, como se a ensinando a jogar.
Percebi que Anna já havia largado o caneco na mesa, e tamborilava nervosamente os dedos.
Na vez da morena, ela encaçapou a última bola, encerrando o jogo. Adivinha o que ela fez? Ela foi comemorar com Lina, dessa vez o abraço durou o dobro do tempo, não que eu estivesse cronometrando. E depois ela colocou a mão no rosto dela, nas minhas covinhas. Epa.
Jennifer fazia a reposição das bolas na mesa, para iniciar uma nova partida, sendo ajudada por Alice, a ex, que sempre dava um jeito de pegar na mão dela enquanto ajeitava as bolas. Lina e a morena conversavam de perto.
– Alice? – Anna me chamou, sem tirar os olhos da mesa de sinuca.
– Sim? – Respondi também sem mover meu olhar.
– Quer jogar sinuca?
– Com certeza.
Largamos nossos canecos e fomos até as garotas.
– As novas parceiras chegaram. – Eu fui logo anunciando, em alto e bom tom.
– Vocês vão jogar? – A morena perguntou decepcionada.
– Vamos sim. Eu e Jennifer contra Alice e Lina. Não você, essa Alice aqui. – Anna disse.
– Que bom! – Jennifer comemorou.
– Você sabe jogar? – Lina me perguntou com um lindo sorriso, enquanto me abraçava pela cintura.
– Eu consigo fazer as bolas se moverem, e não acerto a branca na cabeça de ninguém, me aceita como parceira?
– Será um prazer. – E ela me beijou.
Vi Anna abraçando Jennifer por trás, lhe dando um beijo em seu pescoço, enquanto ela terminava de ajeitar as bolas.
– Promete que não vai trapacear?
– Eu nunca trapaceio, eu realmente sou boa. – Jenny respondeu, rindo.
– Amor, suas bolas fazem curvas que desafiam as leis da física. – Escutei Anna sussurrando no ouvido dela.
Jennifer apenas riu abertamente.
A partida seguia normalmente, exceto pelo fato das tacadas de Jennifer realmente parecerem assombradas.
– Jenny, você disse que hoje os efeitos estavam proibidos. – Lina a interpelou.
– Você também deve saber dar umas tacadas legais. – Jenny provocou.
– Sei, sei sim. – Lina parecia ter aceitado o desafio, seja lá qual fosse.
Ela tomou aquele pequeno giz quadrado azul que eu sempre uso e não sei para o que serve e girou na ponta do seu taco, confiante. Mirou atentamente na bola de marfim branca e disparou, a bola laranja a frente fez uma curva incrível, caindo de forma improvável na caçapa ao lado.
– Ok, vocês duas, chega de efeitos. – Anna decretou, dando um tapinha no taco da sua prima.
Eu ainda estava boquiaberta com aquela tacada digna de um espetáculo de malabares da sinuca, quando a garota de seios fartos sussurrou no meu ouvido.
– Você está ficando com a mocinha de olhos verdes?
A fitei espantada, ainda boquiaberta.
– Não. – Respondi de bate pronto, porque meu cérebro processou a pergunta erroneamente.
– Não? Então você não se importaria se eu a convidasse para dançar, certo?
– Você tá doida? – Meu cérebro ainda estava se recompondo.
– O que foi? – Lina deve ter percebido meu semblante estranho e veio averiguar se estava tudo bem entre mim e a morena de seios fartos.
– Eu achei que havia algo entre vocês duas, mas ela me disse que não. Quer dançar? – A morena disse com um sorriso contente.
Lina me olhou como se eu tivesse xingado seus antepassados.
– Você disse a ela que nós não temos nada? – Lina me indagou, meio incrédula e confusa.
– Sim. Não. Não, eu não disse isso. – Eu sacudi a cabeça para que as ideias se ajeitassem lá dentro.
– É sua vez, Alice! – Jenny gritou para mim, da mesa de sinuca.
A outra Alice tomou um taco da parede e foi jogar.
– Hey! Ela estava falando comigo! – Gritei de volta.
– Alice, porque você disse à Janice que nós não temos nada? – Lina perguntou novamente.
– Desculpe, não quis causar nenhum mal-estar. – Janice, a morena de seios fartos, resmungou.
– Largue esse taco! – Bradei à outra Alice.
Tentei ir até a mesa de sinuca para dar minha tacada e impedir que minha xará jogasse na minha vez, mas esbarrei nos seios de Janice.
Anna e Jenny se entreolhavam sem entender aquele princípio de pandemônio. Lina me olhava com uma confusão de dar dó.
Me desviei do par de seios e fui até a mesa, dei minha tacada, errando a caçapa, como sempre. Voltei à presença de Janice e Lina, limpei a garganta, e soltei com convicção.
– Desculpe o mal-entendido, não estamos ficando, estamos namorando.
Lina riu, e eu não entendi o porquê.
– Amor, tente de novo, mas agora na língua dela. – Lina disse.
Eu dei um sorriso amarelo e repeti, agora na língua nativa da moça, que retribuiu o sorriso na mesma cor e se retirou.
Lina me puxou carinhosamente pela mão, e me perguntou ainda tentando entender.
– O que aconteceu?
– Eu travei, me desculpe.
– Travou?
– Ela queria dançar com você.
– E?
– E eu ainda estou trabalhando no meu íntimo essa coisa de compromisso, tenha paciência comigo. – Pedi com jeitinho.
– Toda. – Lina me beijou e me conduziu para a mesa. – Vamos ganhar delas.
– Sem efeitos! – Anna completou.
Perdemos, mas passamos o restante da noite de forma agradável, salvo aquele pequeno impasse com a moça dos seios fartos.
Na volta para casa, Jennifer dirigia seu grande carro negro, eu e Lina seguíamos aconchegadas no banco de trás.
– Posso ligar o som? – Jenny pediu.
– Claro. – Concordamos.
– De preferência sem explodir nossos tímpanos. – Anna baixou o volume.
– Adoro essa música! Vocês gostam?
Lina olhou para mim de sobrancelhas baixadas identificando a música. E explodimos numa risada.
Era Bizarre love triangle.
– Não mais, Jenny. Não mais. – Respondi.
FIM