Capítulo 35 – Celeridade

Capítulo 35 – Celeridade

 

Theo já estava deitada na larga cama, assistindo a tela em frente, sonolenta. Enquanto Sam preparava mais alguns medicamentos, os das dez horas e mais alguns por conta da cirurgia.

Sam sentou-se ao seu lado na cama, tomou seu braço e verificou o acesso, parecia ainda funcional. Theo observava toda a movimentação dela agora.

– Esse vai te fazer dormir até amanhã – Sam explicava, ao injetar o segundo líquido.

– Dormir é desperdício de tempo, eu quero ficar acordada olhando para você.

– Você vai poder olhar para mim até cansar, não tenha pressa.

– Já posso te beijar ou ainda é demais para meu coração?

Sam sorriu e a beijou, Theo a prendeu pela nuca, prolongando o beijo.

– Um arco-íris. – Theo disse ao fim.

– Vou guardar tudo isso e venho deitar com você, daí você terá quantos arcos-íris quiser.

Sam finalmente voltou para a cama, deitando a seu lado, ainda se ajeitava sob as cobertas quando Theo a puxou novamente pela nuca.

– Vem cá.

Theo a beijou, em segundos estava em cima dela. Era diferente, era ainda melhor.

O beijo cessou devagar, Theo deixou o rosto cair em seu pescoço, Sam a abraçava firme, por algum tempo apenas ouviam seus silêncios e batimentos.

– Lembra que eu disse que havia pego a mais gostosa do quartel? – Theo disse, e ambas riram.

– Lembro.

– Eu peguei a mais gostosa, ‘e’ a mais bonita do quartel.

Sam apertou o abraço.

– Quem pegou fui eu, estou pegando até agora.

Theo ergueu-se, ficando com o rosto acima do sorriso tímido da sua namorada, sob uma luz fraca, mas suficiente para perceber mais um pouco de cada traço dela.

– Você é linda.

– Sou diferente do que você havia criado aí dentro? – Sam perguntou, a fitando amorosamente.

– É sim, boa parte.

– Muito?

– Não. Eu acertei muitos detalhes, mas errei a essência, o conjunto.

– Está se acostumando?

– É você. – Theo abriu um sorriso. – Meu subconsciente não tem a menor dúvida que é você, sua aparência soa familiar, e isso porque nem vi tudo.

– Já viu tudo.

Theo mudou para um sorriso malicioso.

– Ainda não vi você nua, e eu estou morrendo de vontade de ver você sem nenhuma peça de roupa, como veio ao mundo.

Sam corou, com timidez.

– Eu preciso de um tempo, tudo bem? – Sam pedia sem jeito.

– É por causa da perna?

– Não, é por… É por tudo. Agora você enxerga, é diferente, tudo mudou.

– Eu nunca te pressionaria a nada, eu sei que no dia que você se sentir segura, vai permitir que eu tire sua roupa, e eu esperarei o tempo que for preciso. Enquanto isso saiba que acho você linda por completo, por todos os lados e visões, mais do que nunca agora eu considero você a mulher mais bonita que já conheci, mais encantadora, o sorriso mais gostoso e safado, você é a mulher dos meus sonhos, tudo se confirmou hoje.

– E eu te amo.

Aquela era a senha inconsciente que faltava para Theo ter certeza que a mulher abaixo de si era de fato a mulher que amava, a senha que quase a fez derramar algumas lágrimas novamente, os olhos mais que brilhantes a fitavam com ternura.

– Eu também te amo, Sam. – Theo corria os dedos pelo rosto da namorada. – Você é a minha oficial.

– Completamente sua.

Theo não conseguiu responder, apenas lhe retribuiu com um sorriso cheio de felicidade, seu coração batia rápido por também estar de sentimento igual.

– Lembra o que eu falei para você naquele bar no México, depois que atravessamos a fronteira? – Sam perguntou.

– Você falou um monte de abobrinhas e ficou com ciúmes da loira no balcão.

– Também. Mas eu disse que um dia colocaríamos todo esse azul para funcionar, lembra?

– Lembro. – Theo continuava em cima dela. – Você é uma mulher de palavra.

– A sensação de ter você me encarando… Ver esse azul funcionando é incrível. – Sam também estava cheia dos sorrisos bobos, como se ambas tivessem sido presenteadas.

– E você não faz ideia do quão majestoso é o que sinto enquanto encaro você.

– Eu tinha tanto medo de ser rejeitada.

– Sam, eu conheço cada milímetro do seu corpo e do seu coração.

– Eu sei.

– Você é uma menininha. – Theo riu.

– Como assim?

– Você aparenta ser mais nova que a imagem que eu havia criado, você é só uma menininha. E uma grande mulher, mas assim olhando para mim com esse sorriso delicioso só enxergo uma menina cheia de vida.

– Hum… Acho que isso é bom.

– Sam… O remédio está fazendo efeito. – Theo soltou o peso do corpo sobre ela.

– Vou te ajeitar. – Sam a deslizou para o lado, a aninhando em seu ombro e braço. – Dorme aqui comigo, fecha os olhos e desliga essa cabecinha.

***

O sol nascera uma hora atrás, a claridade que adentrava o quarto era pouca, mas luz demais para quem passara os últimos meses na escuridão total. Theo acordou devagar, sentindo uma alegria imediata ao mais uma vez se dar conta que enxergava. Abriu um sorriso lento com a bela visão à sua frente, lá estava sua coleção de bonés, que ainda não havia percebido no quarto. Se deu conta de uma outra bela visão que estava do seu outro lado, sua namorada adormecida, o travesseiro com uma mancha molhada abaixo de sua boca.

– Agora tenho certeza que é você. – Sussurrou para si mesma, rindo.

Sentou-se na cama, de frente para Sam, que ainda dormia com semblante sereno. Levou seus dedos até o rosto dela, enxugando levemente o canto da sua boca.

– Que babona…

Perdeu-se por ali, a contemplou por algum tempo, observando seus detalhes, formas, sua silhueta. Olhava porque podia, como Sam sempre pode e sempre o fez.

Sam dormia com uma camiseta vermelha já bastante usada e de gola larga, Theo inclinou-se para frente ao perceber a visão do início do vão dos seus seios através da gola, bem como o início de sua cicatriz, inclinou-se mais, com curiosidade, movendo a cabeça de um lado para outro tentando enxergar mais um pouco daquele vão. Esticou sorrateiramente sua mão na direção da camiseta, seus dedinhos nervosos se aproximando da borda da gola, quando teve sua mão abruptamente confiscada por outra mão firme, lhe causando um enorme susto. Soltou uma exclamação assustada que disparou seu coração.

– Onde você estava indo com essa mãozinha? – Sam perguntou ainda segurando sua mão.

– Eu? Que mão?

– Essa mão lhe pertence?

– Pertence.

– Onde ela estava indo?

– Eu só estava olhando você dormir. – Theo respondeu gaguejando.

Sam continuou a fitando, por fim soltou sua mão e abriu um sorriso.

– A curiosidade matou o gato, sabia? – Sam virou-se para cima, bocejando e se esticando.

– Desculpe ter acordado você.

– Suba aqui, amor.

– Em você?

– É, venha me dar um beijo de bom dia.

E Theo, sem titubear, a obedeceu.

– Bom dia, oficial. – Theo lhe disse após um longo beijo, em cima dela.

– Bom dia, recruta. – Suspirou com preguiça. – Como tá a visão?

– Melhor que ontem.

– Isso é muito bom, criança curiosa.

– Eu estava tentando ver sua cicatriz.

– Essa? – Sam baixou a gola da sua camisa com dois dedos, expondo a longa cicatriz na vertical, entre os seios.

– É. – Theo olhou atentamente com curiosidade, e deslizou seus dedos por ela.

– Na verdade são duas, uma por cima da outra.

– Dá para identificar… Uma quando você morreu, e uma quando você renasceu. – Theo continuava sentindo com os dedos enquanto observava.

– Exato.

Theo tomou a mão que Sam prendia sua blusa, e levou até sua boca, a beijando.

– Foi por pouco, muito pouco. – Theo disse ainda com a mão dela sobre sua boca.

– O que?

– Quase seu coração artificial parou aqui dentro.

– Nove horas antes do prazo, foi quando entrei para a cirurgia.

– Foi na tarde seguinte?

– Foi. Acordei à noite, com a notícia que você estava passando por uma segunda cirurgia.

– Eu passei por várias… Não sei como ainda tenho cérebro.

– E eu quase morri em todas, em pânico. – Sam sorriu. – Ah, sabe qual foi a primeira coisa que eu vi quando acordei?

– O que?

– O coração, e ele é azul.

– Azul? É a sua cor preferida. E que fim levou seu coração azul?

– Está no cofre.

– Aqui em casa?

– Uhum, você pode matar a saudade quando quiser, foi meu primeiro coração a se apaixonar por você.

– Tem meu nome lá dentro?

– Em cada peça e engrenagem.

– E nesse? – Theo apontou para o peito dela.

– Em cada átrio e ventrículo.

Após algum tempo preguiçoso sobre Sam, finalmente Theo saiu da cama, indo para o banheiro.

– Sem muletas?

– Eu vou devagar. Vou tomar um banho.

– Quer ajuda?

– Não, estou melhor hoje.

– Ok, mas não feche a porta.

Sam sentou na beira da cama, ainda com sono, correndo as mãos pelo rosto. Theo tirou sua roupa já dentro do banheiro, e ao atirar no cesto viu seus braços coloridos, olhou cada tatuagem, matando saudades de seus desenhos. Ao passar pelo espelho acima da longa pia dupla de mármore cinza, estancou o passo, vendo seu reflexo. Se observava com atenção e um tanto de curiosidade, sentiu-se diferente do que conhecia, levou a mão ao rosto e queixo, movendo a cabeça de um lado para outro, enquanto fitava o espelho. Talvez fosse por conta da quantidade de experiências vividas e do período de recuperação do tiro, mas se achou mais velha, com fisionomia mais madura. Sam a observava da cama.

Theo continuava olhando seu reflexo, agora um tanto pensativa. Sam aproximou-se, e a abraçou por trás.

– Viu como você está cada vez mais bonita? – Sam brincou, beijando seu pescoço.

Theo apenas sorriu fitando no espelho a imagem de Sam a beijando, sentiu algo bom e morno subindo em seu peito.

– Preciso de novas tatuagens. – Theo comentou.

– Ah é? Onde?

– Vários lugares.

– Por exemplo?

– Aqui. – Theo apontou para o centro do seu peito.

– Qual desenho?

– Não sei. Algo nas costas também… E nas pernas.

– Você vai virar um desenho animado. – Sam riu.

– E você vai parar na primeira?

– Hum… Estou pensando em fazer algo no ombro, pequeno.

– O que?

– Estou desenvolvendo a ideia, depois compartilho com você.

– Você viu isso? – Theo se virou para trás assustada.

– O que?

– Passou alguém aqui atrás, tem alguém no quarto.

Sam saiu do banheiro, tomou rapidamente uma arma dentro da cômoda e verificou o quarto inteiro, Theo vestiu um roupão.

– Não tem ninguém aqui. – Sam guardou a arma e voltou ao banheiro.

– Eu vi alguém.

– Sua visão ainda está se recuperando, Letícia me disse que o médico falou sobre isso, sobre você ver coisas onde não tem nada.

– Não tem ninguém mesmo?

– Não tem, pode ficar tranquila, são seus olhos lhe pregando peças.

– Que susto…

– Tome seu banho, vou lá fora buscar suas muletas, depois vamos tomar um bom café. – Sam roubou um beijo e saiu.

***

Naquela tarde Letícia e Daniela visitaram a mansão de vidro, e entregaram a Theo um presente que a deixou em polvorosa.

– Eu preciso estrear isso agora. – Girava uma bola de basquete nas mãos, estavam sentadas nos sofás da sala de mídia.

– Jogue nas paredes. – Sam sugeriu.

– Não, eu quero jogar basquete de verdade.

– De muletas?

– Não, cadeira de rodas.

– A sua não é uma cadeira própria para isso, nem você tem condições de jogar basquete de verdade hoje. – Sam a repreendeu.

– Só brincar um pouco na quadra lá fora.

– Theo, você passou por uma cirurgia anteontem.

– Mas estou bem, me leva lá, vai. – Theo pedia manhosa.

– Você consegue dizer não para essa pessoa? Eu nunca consegui. – Letícia disse.

– Tá bom, vamos jogar um pouco. – Sam levantou e buscou a cadeira de rodas.

– Eu quero a Dani como parceira, sei que ela jogava basquete na faculdade. – Theo se manifestou, já a caminho da quadra.

– Então não acha que devemos balancear as coisas? Você num time, Dani no outro. – Sam disse.

– Eu jogava sim, mas jogava mal, era só lazer. – Daniela informou.

– Ok, casal contra casal. – Theo determinou, e moveu-se de um lado para outro pela quadra, girando as rodas com as mãos.

– Essa cadeira não foi feita para girar as rodas manualmente, você sabe disso, não sabe? Melhor você usar o painel de comando – Letícia a alertou.

– Se estragar eu compro outra, eu quero girar assim, com as mãos.

– Então deveria usar luvas, vai queimar as mãos assim. – Sam disse.

– Sam, pare de bancar a minha mãe, me deixe fazer o que eu quiser, que coisa. – Reclamou.

– Então faça o que você quiser, depois não venha reclamar que machucou a mão.

Theo parou sua cadeira de frente para sua namorada, ajeitou seu boné azul e branco, e a fitou séria.

– Me dê essa bola.

– Tome. – Sam a entregou.

– Você tá expulsa, vá para o banco. – Apontou para uma pequena arquibancada ao lado.

Sam a fitou séria por um tempo, e se dirigiu à arquibancada. Theo atirou a bola nela, batendo em suas costas.

– Volte aqui, sua idiota, eu estava brincando! – Theo disse.

Sam pegou a bola que rolava no chão e atirou em Theo.

– Hey! – Theo agarrou a bola e colocou no colo. – Volte aqui! – Saiu girando em alta velocidade suas rodas na direção dela.

– Honre suas calças, atire quando eu estiver de frente para você, não pelas costas. – Sam gesticulou pedindo que ela jogasse a bola.

Theo se aproximou e atirou a bola na cabeça dela.

– Ah, agora você vai ver. – Sam correu atrás da bola, que foi na direção de Letícia. A médica tomou a bola em mãos e jogou para Theo, as duas riram.

– Valeu, Lê!

– Então o time é você e Letícia? – Sam perguntou com deboche.

– Venha, tente roubar a bola. – Theo provocou, jogando a bola de uma mão para outra.

– Ok, o jogo já começou? Minha parceira de time é a Samantha? Para qual lado eu tenho que correr? – Daniela perguntava confusa.

– Cesta única, aquela ali. – Theo apontou para uma das tabelas. – Eu e Letícia contra Sam e Dani. E você, tenente, prepare-se para uma derrota horrível.

– Não ache que terei piedade de você porque está numa cadeira de rodas.

– Não ouse ter. – Theo respondeu no mesmo tom, e atirou a bola para Letícia.

– Nem coloque a culpa da derrota na mãozinha mecânica.

– Minha mão mecânica arremessa melhor que suas duas mãos.

Letícia saiu quicando a bola na direção da cesta e Sam partiu para cima dela. Ela se assustou e atirou a bola de volta para Theo, que colocou em seu colo e partiu girando sua cadeira para o outro lado do garrafão, sendo perseguida por Daniela.

– Vem Lê! – Atirou a bola para Letícia novamente, mas Sam se antecipou e roubou, bloqueando o passe.

Sam correu em disparada para a cesta, pulou lateralmente com um joelho erguido, atirou a bola contra a bandeja, e ponto para a dupla Sam&Dani.

– Mas que porra de salto foi esse? – Theo perguntou perplexa.

– Perna Borg, querida. – Sam passou por ela e deu um tapa na aba de seu boné. – 2 a 0.

Letícia buscou a bola no chão e atirou para Theo, que desta vez se deslocou em linha reta para a cesta, com semblante revoltado. Parou a cadeira e fez o arremesso, a bola foi interceptada por Sam, que passou de imediato para Dani.

– Marca a Samantha que eu pego essa loira aqui! – Leticia disse e correu na direção da namorada.

Theo correu sua cadeira na direção de Sam, que aguardava o passe de Daniela. A tenente fazia pequenas corridas de um lado para outro, sendo seguida pela cadeira de rodas. Sam parou a sua frente rindo, com as mãos na cintura.

– Cansou?

Theo já estava encharcada de suor e ofegante.

– Vou marcar você até o inferno.

Sam riu ainda mais, e pediu a bola para Dani, que passou sem dificuldades.

– Você quer a bola? – Sam a quicava com mãos alternadas.

Theo investiu na sua direção, Sam estendeu o braço para ela, lhe oferecendo a bola, quando a cadeira se aproximou, Sam ergueu a mão e passou por cima da cabeça dela.

– Passa para mim de volta! – Sam disse e jogou a bola para Dani, continuou correndo e recebeu a bola quase embaixo da cesta, arremessou e converteu a cesta sem parar a passada.

– 4! 4 a 0! – Zombou de Theo. – Onde está a jogadora universitária?

– Tempo. – Theo pediu, e chamou Letícia.

– Já? Ok, um minuto. – Sam respondeu, e Letícia se abaixou ao lado da cadeira de Theo.

– Lê, ela não vai me deixar fazer nenhuma cesta, preciso que você faça.

– Mas eu sou péssima nisso, meu anjo.

– Eu vou na direção da tabela, ela vai impedir minha passagem, nesse momento você vem pelo lado, eu passo a bola e você arremessa, é simples.

– Dani vai pular na minha frente.

– Daniela está mais perdida que calcinha em lua de mel, não vai te impedir de arremessar.

– Eu vou tentar, é o máximo que posso prometer.

– Minha honra depende disso, Letícia.

– Acabou? – Sam berrou.

– Tome, eu vou correr pela direita, você vem pela esquerda de mansinho, me passe a bola quando eu estiver entrando no garrafão.

Theo passou a bola para sua parceira e saiu rodando desesperadamente suas rodas pelo lado direito, Sam a aguardava mais à frente. Letícia fez o combinado, passando a bola para ela, Theo rodou mais um pouco, fez um falso movimento de arremesso, Sam pulou, Theo passou a bola para Letícia, que se aproximou sem marcação e arremessou, a bola bateu no aro e não entrou.

Sam pegou o rebote e converteu com facilidade.

– 6 a 0, tá ficando feio, quer parar? – Sam provocou.

– Ainda não.

Reinício, Letícia passou a bola para Theo, que seguiu para o lado oposto dessa vez, parou antes da linha dos três pontos, e arremessou, fazendo um esforço sobre-humano.

A bola bateu na tabela e não entrou, Sam pegou o rebote, e passou para Dani.

– Arremessa, parceira! – Sam incentivou.

Dani olhou em dúvida para Letícia, com a bola em mãos.

– Vai, amor. – Letícia sussurrou, enquanto a marcava a sua frente.

Daniela arremessou e converteu.

– Arrasou, Dani! 8! 8! – Sam comemorou, batendo sua mão espalmada contra a mão da sua parceira.

Theo juntou a bola ainda quicante e passou pata Letícia. Apoiou-se com ambas as mãos nos descansos de braço da cadeira, e ergueu-se, com dificuldade.

– Vai jogar de pé? – Sam perguntou, desta vez com preocupação real em sua voz.

– De igual para igual. – Respondeu sem olhar para ela.

Sam foi até ela.

– Você vai cair, volta para a cadeira.

– Cair sete vezes, levantar oito, já dizia o provérbio japonês. – Theo girou seu boné suado, colocando a aba para trás, e caminhou devagar para a entrada do garrafão, mancando da perna esquerda, a perna ainda debilitada. Sua camisa já estava totalmente molhada de suor, o rosto vermelho.

– 8 a 0, não é? Pode passar, Lê!

Letícia passou a bola para ela, que a conduziu quicando para a lateral da linha dos três pontos, caminhando lentamente. Sam a seguia de perto.

A médica veio correndo pedindo a bola, Theo passou, Lê seguiu para a tabela e arremessou de bandeja, a bola bateu e não entrou, Daniela pegou o rebote.

Theo foi para frente de Sam, para que ela não recebesse o passe de Dani. Sam saiu com facilidade da marcação, recebeu a bola e converteu.

– Você não erra nunca? Onde aprendeu a jogar assim? – Theo reclamou.

– Tínhamos bastante tempo livre no quartel, o que acha que fazíamos? – Sam respondeu.

– Você estava escondendo o jogo?

Sam apenas riu.

– Espera, não é só isso, você ainda tem outras coisas Borg! – Theo se dava conta.

Sam continuou rindo.

– Eu vou deixar você fazer uma cesta, tá bom? – Sam disse.

O semblante de Theo se tornou puro furor.

– Eu não quero que você deixe porra nenhuma. – Seus olhos pareciam lançar faíscas azuis.

– Theo, que dar uma paradinha? – Letícia perguntou, com a bola em mãos na linha de saída.

– Só depois que marcarmos os primeiros pontos. Me passa! – Theo contornou Sam e foi na direção da amiga.

Recebeu a bola e caminhava devagar próximo ao garrafão, com Sam a sua frente, fazendo uma barreira.

– Embaixo, Lê! – Theo passou para ela, e caiu de joelhos com o movimento.

Sam prontamente ajoelhou-se a sua frente.

– Machucou?

Theo levantou-se com esforço, olhou os joelhos ralados com pontos de sangue, passou a mão por eles, limpando.

– Não, não machucou nada.

Letícia se aproximou com a bola em mãos, preocupada.

– Tudo bem?

– Lê, você caminhou com a bola, isso é falta, entregue a bola para elas.

Ela entregou a bola para Daniela, que passou para Sam. Theo ficou a sua frente, tentando impedir que ela seguisse em frente, a encarando e balançando os braços.

– Vamos, passe por mim, oficial. – Theo provocou.

Sam seguiu batendo a bola, Theo deu um tapa e lhe roubou a bola, deu dois passos afoitos a frente e arremessou, a bola correu pelo aro e entrou. Caiu novamente de joelhos, ralando também as mãos.

– 8 a 2! – Bradou ao se levantar, após limpar os joelhos e mãos.

– Quem fizer 10 pontos primeiro leva o jogo! – Sam berrou também.

– Jesus, vocês duas são muito competitivas. – Letícia reclamou.

Daniela passou a bola para Sam, a oficial correu em disparada, tomou impulso e deu um grande salto, enterrando rapidamente a bola.

– Fechou! – Sam disse com os baços erguidos comemorando.

– Ainda não! Você deu quatro passos com a bola em mãos! – Theo protestou.

– Theo, você desaprendeu basquete e desaprendeu a contar também?

– Me passa a bola, Lê!

Letícia jogou a bola para ela, que caiu sentada no chão.

– Theo, chega, você não tem mais condições. – Sam disse agora de forma séria, se aproximando dela.

– Me ajuda a levantar.

– Ajudo, mas vou buscar a cadeira.

Sam virou de costas na direção da cadeira, Theo atirou a bola contra suas costas, a enfurecendo. Sam apenas parou o passo, virou-se devagar, e a olhou como se tivesse sido mortalmente ferida.

– Eu disse para não jogar pelas costas.

Theo a fitou apavorada e muda, ainda sentada no chão.

Sam caminhou até ela, ajoelhou-se com as pernas ao redor da cintura, pousou as mãos nos ombros e a deitou, ficando por cima dela, segurando seus pulsos, com seu rosto a menos de um palmo do rosto dela, o boné saiu da cabeça de Theo.

– Eu disse para não atirar a bola nas minhas costas e você atirou.

– E eu disse para nunca mais prender meus pulsos, e você está prendendo.

Sam soltou imediatamente, desceu seu rosto na direção dela, e Theo falou num tom sério.

– Eu vou morder você.

– Não vai não.

– Eu vou te morder, Samantha.

– Não vai não.

– Vou sim.

– Se me morder nunca mais beijo você.

– Me beije e terá sua resposta.

Sam a encarou hesitante.

– Eu vou testar. – Sam disse rindo, e a beijou.

Theo adorou aquele beijo cheio e com gosto de suor, não o interrompeu, não a mordeu.

– Boa garota. – Sam zombou sorrindo ao final.

Theo deu uma joelhada entre suas pernas.

– Ai!

– Saia de cima de mim e busque a cadeira.

– Estão todas intactas? O relacionamento também? – Letícia perguntou se aproximando.

– Sim, mas não posso dizer o mesmo do ego de Theo. – Sam zombou enquanto buscava a cadeira.

Dani ajudou Theo a se levantar do chão, Sam a pôs na cadeira, colocou a bola no colo e o boné na cabeça.

– Vamos lá, amor, de bandeja. – Sam disse e saiu empurrando a cadeira, na direção da tabela.

Ao se aproximar, Theo fez o arremesso lateral na bandeja, convertendo.

– Muito bom, parceira! – Sam ergueu a mão espalmada, Theo correspondeu ao bater de mãos.

– Pelo outro lado agora. – Theo se animava.

Lê atirou a bola para ela, Sam correu com a cadeira pela lateral do garrafão, e Theo converteu mais uma cesta, o sorriso de criança fazendo arte logo surgiu.

– Agora com assistência. – Sam jogou a bola para Daniela, deu a volta com a cadeira e investiu em velocidade novamente.

Dani correu em paralelo e fez o passe quase embaixo da cesta, Theo arremessou apenas com a mão direita, a bola não entrou. Letícia fez o rebote, Sam novamente contornou o garrafão, de Letícia para Daniela, de Daniela para as mãos de Theo, e mais uma cesta.

Mais cinco jogadas e Theo atirou a toalha.

– Se eu tentar arremessar mais uma, meu braço esquerdo vai cair, chega por hoje. – Theo disse, jogando a bola para Sam.

– Embora para o chuveiro, então. – Sam colocou a bola no colo dela, Theo segurou sua gola e a puxou para perto.

– Se um dia eu conseguir correr, nós vamos voltar para essa quadra, e vamos jogar novamente, apenas eu e você. – Puxou ainda para mais perto. – Eu contra você. – Theo murmurou entredentes, a encarando de perto.

 

Celeridade: s.f.: Característica do que é célere; agilidade, rapidez, velocidade.

2 comentários Adicione o seu
  1. Schwinden,
    Capítulo mais que perfeito! !
    Boaa competição de basquete..curto esse jogo tb, ainda que n jogue mt por aqui.

    Achei mt engraçado o que Theo falou:”Mais perdida que calcinha em lua de mel” hahahaha

    Amei a cena entre elas..mt doce!!

    As vezes vc escreve e digo:É vc??rs.
    Tão seria…..
    Queria dizer algo que notei…pra mim Sam ta c uma personalidade mt diferente da que vc escreveu. .e não digo que foi pq ela mudou e é claro que vamos mudando com o tempo, mas n sei dizer…é como se vc tivesse criado outro personagem. .como se la togesse se perdido. Ainda assim, prefiro essa….

  2. Não sei o que houve com o blog ontem, mas não tava entrando. Então li esse cap no Lettera e não sei explicar, mas a sensação é diferente. Prefiro aqui, tive que reler pra sentir. Não desmerecendo o Lettera, claro.
    Muda a minha percepção da história, sei la.
    Tava com saudade… E sobre o cap em questão, não tenho muito o que comentar, só que esses bug de visão da Theo ainda vai dá ruim.. Pode ser uma vantagem pro Elias…

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